Singularity - Capítulo 07: Grande Cidade, Pequena Vampira

O trabalho continuou por quase dois anos. Aprendi a chegar à pequena loja antes do amanhecer e me escondia nos fundos até depois do anoitecer. Saia para caçar quando eu precisava, e ia ver partes de Nashville e arredores, sempre que eu queria. Até mesmo assisti alguns espetáculos de variedades tarde da noite, e dancei em uns poucos bares que tinham música. Enquanto dava conta do trabalho detalhado que eu estava fazendo para Myrtle e Hank, eu não ficava sem encomendas. O dinheiro que eles me pagavam era uma ninharia, eu sabia, mas sem quaisquer outras despesas, o pouquinho de salário ia acumulando. Ninguém jamais ia à área do sótão da igreja, então que eu continuava lá, ouvindo música, lendo livros que eu encontrava ou comprava, e decorando o espaço com as poucas coisas que eu possuía.

Também usei o tempo para tentar compreender minhas visões. Obviamente, a visão mais importante era frustrantemente obscura, mas eu sabia agora que o vampiro alto, loiro, com olhos tristes seria meu companheiro. Eu não tinha visto isso, mas eu sabia daquilo como eu também sabia o meu nome. Eu sabia, e isso fazia meu coração silencioso arder de dor, que a razão por que a visão era tão obscura era que ela teria lugar no futuro distante. Quanto mais próxima uma visão era no tempo, mais ela se tornava clara, e então esta estava muito distante.

Então, em 24 de agosto de 1925, Hank morreu.

Eu entrei na loja, como de costume, na segunda-feira, para ver o que precisava ser feito, e encontrei os dois se preparando para deixar-me cortar alguns vestidos de damas de honra. Eu tinha ficado encarregada do corte, uma vez que os olhos de ambos estavam ruins. Eu tinha decidido que uma das razões pelas quais eles não me temiam tanto é que os dois estavam quase cegos.

Na metade do corte, meus afiados ouvidos ouviram uma batida surda na sala da frente, seguido de um grito, “NÃO!”

Corri para ver Hank de bruços no chão com Myrtle tentando virá-lo. Corri até lá e virei-o esperando que ele estivesse apenas tendo algum tipo de ataque, mas estava claro para os meus olhos de caçadora que não havia pulso. Ele estava morto antes de chegar no chão.

De repente, meu peito pareceu como se meu silencioso coração tivesse sido removido e o buraco preenchido com chumbo. Eu não conseguia pensar rapidamente porque as palavras ‘ele se foi’ ficavam ecoando em minha mente, empurrando qualquer outro pensamento para fora do caminho. Em estado de choque, eu fui à farmácia da esquina e pedi à eles para ligarem para a funerária, e voltei para ver Myrtle soluçar sobre o corpo de Hank.

Demorou apenas cerca de 10 minutos para o homem da funerária chegar depois de eu ter telefonado. Ele era um homem amável e se desculpou várias vezes a Myrtle enquanto rapidamente levava o corpo de Hank embora. Myrtle e eu simplesmente ficamos paradas juntas na loja agora vazia, de mãos dadas. Eu não podia acreditar o quanto a morte deste homem me deixou na miséria súbita. Eles eram minha família, e agora ele se foi, e ela era uma concha vazia chorando ao meu lado. Ela estava tão perturbada, que ela nem percebeu a minha mão enquanto a segurava.

Levei Myrtle para cima, para sua casa, e esperei que seus amigos da sinagoga chegassem, mas saí rapidamente quando eles começaram a chegar, porque eles definitivamente tinham medo de mim. Hank era judeu, então ele foi prontamente enterrado no dia seguinte. Pensei que o melhor era apenas voltar para a loja e terminar o que precisava ser feito. Permaneci na loja todo o resto do dia e durante a noite, trabalhando e terminando projetos. Fiquei contente de ter tempo para estar de luto pelo homem que me aceitou como humana.

A dor era especialmente pungente para mim porque eu tinha cometido tantas mortes em minha curta vida, e a realidade do que eu tinha feito me veio à tona em um novo nível.

É isso o que sentiram todas as famílias das minhas vítimas? É essa dor que eu tenho dado aos outros?

A culpa tomou conta de mim. Eu tinha que fazer as coisas direito, por Myrtle, e de alguma forma compensar por todos os outros que eu tinha matado.

Ela voltou na quinta-feira.

“Oi, Myrtle. Eu fiquei e terminei o seu trabalho. Espero que não tenha problema”, eu estava quase gaguejando enquanto tentava dizer algo para ela. Eu estava totalmente perdida.

Myrtle apenas olhou para mim através de seus óculos inacreditavelmente grossos. Finalmente, ela disse, “Obrigado”, em um tom triste. Ela não tinha nenhuma expressão em seu rosto, era como se o corpo dela estivesse lá, mas ela não estivesse nele.

“O que você quer que eu faça agora?” Eu quase implorei. Eu estava desesperada para ajudá-la de alguma forma. Eu queria compensar pela morte de Hank de algum modo.

“Não há nada para ser feito?”, Ela parecia confusa.

“Não, Myrtle, eu terminei todas as encomendas. Elas foram todos entregues, e o dinheiro está no caixa. Você tem mais encomendas?”

“Não, não haverá mais encomendas… Não mais… Eu estou vendendo a loja para Horowitz Costuras… Vou para casa.”

“Você está em casa.”

“Eu estou indo para Nova York. Minha irmã quer eu vá e fique com a família dela. Eu vendi tudo. Eu só vim para pegar alguns itens e, em seguida vou para Nova York.”

Ela ainda parecia confusa, como uma criança perdida. Eu precisava ir tomar fôlego, mas não sentia que eu poderia deixá-la ainda. Então, respirei um profundo e flamejante fôlego e segurei a besta com toda a minha força de vontade. Em dois anos, eu não tinha respirado ao seu redor, e o ar na loja quase deixou minha mente louca com o grosso aroma. Mantive o meu fraco controle tão firmemente quanto pude e disse com os dentes cerrados, “Eu vou ajudar. O que você precisa?”

Ela vagou pela loja e pegou alguns itens estranhos: os óculos dele, seus dedais, uma almofada de alfinetes, um cachecol que ele usava em dias frios, e vários outros itens pequenos. Nós os colocamos em um saco, e eu a levei para cima para a sua pequena casa.

“Myrtle, o que mais posso fazer? Eu quero ajudar você. Você e Hank são a única família que eu realmente já tive, e eu só quero agradecer de alguma forma.”

“Família?” Ela olhou para mim e seus olhos de repente pareciam um pouco mais claro. “Você não tem ninguém aqui em Nashville?”

“Não. Eu não tenho ninguém em lugar nenhum”, eu disse sem emoção alguma. Era estranho como eu me senti oca declarando este simples fato. Eu não tinha ninguém exceto ela, e o pensamento de repente me fez me sentir muito fria por dentro, porque pela primeira vez em meus quatro anos, eu sabia que imortal significava perda e solidão, ao invés de vida eterna.

“Venha comigo. Você é a única família que me resta, então você vem para Nova York comigo. Por favor, diga que você vem comigo”, ela pediu. Eu nunca tinha sido convidada a ficar com ninguém, e a sensação era quente e agradável.

Por que não? Talvez esta seja uma maneira que eu possa compensar os meus pecados passados.

Ela precisa de ajuda, e eu podia ver a cidade grande.

Demorou cinco dias para que ela estivesse pronta para ir. Ela havia realmente vendido tudo, por isso ela tinha apenas algumas malas para carregar para dentro do trem que nos levou à Grand Central Station, na cidade de Nova York. Minhas duas malas estavam lotadas com as roupas que eu tinha comprado ou feito para mim mesma e alguns dos livros que eu tinha.

Quando foi que eu arranjei tudo isso e onde eu colocava isso? Eu me perguntava enquanto empurrava o último dos itens nas malas perigosamente lotadas.

A viagem de trem foi a coisa mais difícil que eu já tinha feito. Felizmente, era verão e as janelas podiam ser abaixadas, porque o vagão de passageiros era velho e com o cheiro de mil de seres humanos. Conseguimos um quarto-dormitório para que ela pudesse descansar e eu pudesse viajar sem ninguém gritando na minha pele. Era muito mais difícil do que eu poderia ter imaginado estar tão perto de tantos seres humanos, então eu mantive minha cabeça para fora da janela durante a noite. Desde de quando eu era uma recém-criada eu não queria sangue humano tanto assim.

Naquela noite, as duas visões mais frustrantes, nas quais eu sabia que minha vida estava totalmente entrelaçada, me atingiram mais fortes e mais claras do que nunca.

Os dois caçadores eram agora três, porque uma mulher tinha se juntado a eles. Eu podia ver os três caçando em algum lugar durante o inverno, ou talvez fosse apenas muito para o Norte. Eles estavam rindo juntos em bosques nevados. Quando a visão terminou, me senti subitamente sozinha. Se eu soubesse onde e quando eles estavam, eu teria pulado para fora do trem e os encontrado. Eu sabia que esta era a família que eu queria e precisava.

A segunda visão aconteceu quando o sol começava a se levantar. Era ele, e meu silencioso coração reagiu a esta visão ferozmente. Ele não estava entrando por uma porta, mas de pé no meio de uma cena horrível. Havia um fogo atrás dele, e ele estava pegando o que parecia ser pedaços de cristal e os jogando no fogo. Eu podia sentir o cheiro muito doce da fumaça. Meus instintos me diziam que isso era morte e destruição, e eu encolhia para longe da visão, mas não podia deixá-la. Eu estava fixada pelo seu rosto, o qual agora eu podia distinguir. Era terrível. Seu pescoço e rosto estavam marcados por aquilo que parecia milhares de marcas de mordida em forma de lua crescente, e isso o fazia parecer assustador e mortal. Mas eram os olhos que verdadeiramente me prendiam porque eram os olhos de um homem preso, quebrado e sem vida. Ele não queria fazer aquilo, eu podia ver isso, mas ele não tinha escolha, e a tristeza em seus olhos forçaram um soluço em mim quando voltei para o presente. Minha outra metade estava sofrendo, e me doía de vontade de confortá-lo. Eu queria mais do que antes saltar deste trem e buscá-lo, mas eu não tinha ideia, novamente, de quando ou onde ele estava.

A única coisa que eu sabia com certeza enquanto o sol subia e eu fechava a cortina, era que eu estava indo na direção certa. Não era coincidência que as duas visões tinham ficado mais fortes quando eu parti para o leste. Eu estava indo no caminho certo.

A irmã de Myrtle, Edwina Schlitz, morava em uma parte bem reservada do Bronx, no que eles chamavam de triplex. Era a casa de seu filho, mas ele tinha dado a sua mãe depois que ele e sua família se mudaram para uma maior, em Manhattan. Seu filho tinha uma enorme quantidade de dinheiro, porque ele era um investidor.

Edwina era apenas ligeiramente menos cega que Myrtle, e saudou-me com toda a suspeita de um nativo de Nova York. Ela passou horas me fazendo dezenas de perguntas, tentando me ludibriar para que eu lhe dissesse qual era o meu real motivo para ajudar Myrtle. Finalmente, ela desistiu e me permitiu ficar no vazio quarto dos serviçais no sótão, o que me satisfazia muito bem.

Myrtle me arrumou um trabalho como costureira noturna em uma das maiores lojas de roupa do Bronx. Eu amava o meu trabalho. Eu estava no centro do mundo da moda, e estava aprendendo mais do que apenas costura e design de roupas, eu estava ficando bastante fluente em espanhol por ouvir as mulheres porto-riquenhas que trabalharam durante a noite nas máquinas.

Nova York provou ser um lugar muito fácil para se viver. Eu era capaz de caçar uma vez por semana, pegando o trem da noite para a orla da cidade e depois correndo cerca de cem milhas para encontrar boa diversão. Eu amava a vida noturna que Nova York oferecia, e eu adorava o fato de que os nova-iorquinos realmente não pareciam se importar que eu era a coisa mais próxima do anjo da morte que eles já tinham visto. Era um paraíso dos vampiros.

Edwina era uma sabe-tudo que realmente parecia saber tudo. Ela muitas vezes conversava comigo sobre operações bancárias e investimentos, e como fazer o dinheiro render. O marido dela tinha sido um banqueiro e seu filho trabalhava em Wall Street, e ela tinha mais conhecimento sobre dinheiro do que qualquer um que eu conhecia.

“Ele vai render por si mesmo se você fizer isso direito. Tudo o que você precisa fazer é se manter um passo à frente do mercado, e ficar de olhos abertos. São os grandes anos 20! Deixe o mercado de ações te tornar rica”, ela me dizia enquanto toda noite eu tomava sua xícara de chá com um pouco de bourbon. “Um bom chá para dormir”, elas chamavam. Depois de dois meses, ela estava finalmente começando a me aceitar como amiga de Myrtle. Eu cuidava delas durante o dia e trabalhava à noite. Nenhuma das duas nem percebia que eu nunca comia ou dormia.

“Me deixe cuidar dos seus investimentos no começo, e em seguida, vou te mostrar o que fazer. Eu sou ainda melhor com dinheiro que meu filho”, ela declarou vitoriosa.

“Eu te darei mil e quinhentos, e se esse dinheiro render, eu lhe darei o restante, mas você tem que me prometer que vai me ensinar tudo o que sabe”, retruquei. Eu estava muito nervosa de perder o dinheiro pelo qual eu tinha trabalhado tão duro. Empregos não eram fáceis para os vampiros.

“Até o fim de dois meses, você terá todo o prazer em me entregar o resto”, Edwina bufou.

Edwina cumpriu sua palavra, e era praticamente uma vidente ela mesma quando se tratava de dinheiro. Dentro de dois meses, o meu dinheiro havia dobrado, e eu lhe tinha dado cada centavo restante que eu tinha. O espírito da época era liberdade-e-curtição, e eu amava cada minuto disso. Edwina era uma professora muito boa, e no Natal de 1925, eu fui capaz de comprar para as irmãs alguns encantadores chapéus e bolsas de uma loja muito chique do lado oeste.

“Você devia trabalhar para o meu filho”, anunciou Edwina em janeiro de 1926. Nós estávamos olhando a seção de investimentos do Times e discutindo os nossos próximos passos. “Você está realmente pegando o jeito do negócio, sabe, e uma garota como você iria muito longe.” Pelo menos é o que ela disse. O que ela quis dizer foi: Meu filho conhece vários homens, e você é jovem e bonita e precisa encontrar um marido.

“Oh, sim, Edwina. Que idéia perfeita!”, exclamou Myrtle, que parecia ter tornado o objetivo de sua vida me ver casada.

Com meus ouvidos perfeito, eu podia ouvi-las toda noite conspirando para me arranjar um homem. Era foi muito doce da parte delas, e, se não fosse uma ideia totalmente mórbida, teria sido hilariante. Do jeito que era minha vida com elas era como uma comédia que você pode ver em um teatro. Duas irmãs viúvas tentando arranjar a vida de sua bela governanta vampira. O enredo tinha potencial.

“Eu realmente gosto do meu trabalho, Edwina, e eu não gosto de trabalhar durante o dia. Além disso, não acontece muita coisa na bolsa de valores durante a noite.”

“Ah, mas é aí que você se engana. O horário da noite é quando todos os bons negócios são feitos. Os jogadores poderosos e ricos trabalham durante a noite para lucrarem de dia. Você vai ver, querida, você seria uma grande ajuda para o meu filho.”

“Pense em todos os homens ricos que se pode encontrar!” Myrtle exclamou, exuberantemente. Ela não era exatamente sutil.

Naquela tarde, eu conheci o mais recente homem que as duas conspiradoras tinham convidado.

Ele era Freddie, o verdureiro do mercado em que fazíamos compras. Ele era bastante agradável, e reagiu da mesma forma que os outros quatro homens que as irmãs tinham forçado a vir. No começo, ele ficou encantado comigo.

“Boa tarde, Sra. Schlitz e Sra. Dewer”, ele educadamente as cumprimentou. Então, ele se virou para mim e estendeu a mão: “Olá Alice, é um prazer vê-la novamente.”

Bem, isso não vai demorar muito tempo.

Seu sorriso largo surgiu no rosto de menino, até que eu deixei ele apertar minha mão. Descobri que tocar minha mão fria como pedra era uma ótima maneira de fazer um pretendente em potencial pensar duas vezes. Ele a apertou e seu sorriso imediatamente deixou o seu rosto.

“Oh, bem, hum, então o que você tem feito para se manter ocupada?” Ele me perguntou enquanto nos sentamos e as irmãs serviram o chá. A auto-preservação se instalou, e ele sentou-se do outro lado da sala de frente para mim.

“Nada mais do que trabalho, trabalho e mais trabalho durante a semana.” Ah, e ter visões e beber o sangue dos animais no fim de semana. “E você, Freddie?”

“Não muito, apenas trabalho e, também ir pescar em meus dias de folga. Você gosta de peixe?”

Eca, eu tinha provado isso, e sangue de peixe era terrível, especialmente porque era frio.

“Não muito. Eu não gosto de animais de sangue frio, mas eu gosto de caçar, todavia, e de fazer compras.” Era a verdade absoluta. A verdade era tudo que eu realmente precisava para fazê-lo ir embora.

“O que você caça?”, ele perguntou.

“Qualquer coisa com sangue quente bombeamento através do seu coração”, eu respondi timidamente, mostrando um pouco dos dentes em um sorriso malicioso.

“Oh, hum …, pegou alguma coisa recentemente?” ele perguntou como as orelhas ficando vermelhas.

“Oh, sim. Na semana passada eu peguei dois alces e um urso pardo perto da fronteira com o Canadá”, disse para seus olhos se arregalando. Não demoraria nada agora.

“Uau! Então… o que você faz com todos os animais?”, ele perguntou, olhando em volta para os troféus costumeiros.

“Eu os como, é claro, bobinho.” Ele só olhou para mim, sem expressão.

Então, uma vez que as duas irmãs não estavam olhando, eu sorri um sorriso enorme para ele. Ele quase quebrou a porta no meio do caminho, deixando as irmãs confusas novamente e se perguntando o que havia de errado comigo para que eu não conseguisse pegar um homem.

Ele durou apenas doze minutos, mas o meu melhor tempo foi de seis minutos e meio com um jovem estudante universitário – Eu era bastante orgulhosa desse. As irmãs não tinham a menor ideia de que o meu verdadeiro problema para pegar um homem era que já tinha apanhado muitos.

Duas noites depois, eu conheci o filho casado de Edwina. Herbert era baixo, gordo e careca, mas ele tinha um ar de importância. Ele me olhou várias vezes, aparentemente oscilando entre medo e admiração, me fez várias perguntas sobre o mercado, e então me pediu para ajudá-lo ser a promotora de uma reunião na noite seguinte. Eu deveria vestir algo “um pouco mais como um vestido de festa do que roupa de trabalho”, e aparecer em seu prédio de escritórios às 20:00 hs.

Naquela noite de quinta-feira, eu me arrumei pela primeira vez. Eu usava um vestido vermelho escuro combinando com o batom rubi, e prendi meu cabelo em cachos pequenos. Eu estava absolutamente deslumbrante. Foi tão divertido me vestir bem e arrumar o meu cabelo que eu fiquei de ótimo humor. Eu não sabia ao certo o que esperar, mas também não estava medo de nada. Eu poderia estar me metendo numa situação ruim, mas eu também poderia estar indo para o meu primeiro encontro profissional e primeira festa, e essa idéia me deixava atordoada de empolgação. Agora, o cheiro humano não era tão potente como tinha sido, e eu era muito boa em encontrar ar puro. Além disso, se a reunião corresse muito mal, eu simplesmente mataria qualquer um que me ameaçasse. Sem problemas.

Cheguei quinze minutos mais cedo, e fui saudada por uma mulher em um vestido curto que era apertado demais para o seu corpo opulento. Eu podia perceber que ela havia sido muito atraente, mas agora ela usava maquiagem demais em seu rosto enrugado e parecia cansada, pelas olheiras ao redor dos olhos inchados. Aqueles olhos quase saltaram fora de suas órbitas quando entrei.

“Oi, eu sou Alice Charles, e Herbert me enviou aqui para ser anfitriã da reunião.”

“Aposto que ele enviou sim!”, ela exclamou enquanto me olhava de cima a baixo. Ela era, obviamente, um desses nova-iorquinos que nem mesmo têm medo do anjo da morte. Eu sorri docemente, isso geralmente funcionava para ajudar os humanos a relaxarem um pouco, mas não funcionou neste caso. “Quantos anos você tem, treze ou algo assim?”, ela demandou.

“Eu tenho vinte”, eu fervi.

Ela levantou uma sobrancelha, pintada de preto. “Você tem alguma identidade para provar isso? Não vou me meter em problemas por você, querida.”

“Você pode perguntar Herbert, a tia dele me conhece,” retruquei. Ela estava estragando o meu divertimento, e eu decidi que não gostava dela. Além disso, eu não parecia ter treze com aquela roupa.

“Você cumprimenta os convidados e pega seus chapéus e casacos. Em seguida, leve bebidas para eles à medida em que eles pedirem do bar. Quando a reunião começar, pegue essa caderneta e sente-se ao lado de Herbert para tomar notas. Você entendeu?” Ela latia as ordens como se eu fosse sua filha.

“Sim, eu acho que posso cuidar disso”, sorri largamente. Ela apenas franziu a testa e se afastou. Essa aí não daria nem uma segunda olhada para o anjo da morte.

Me posicionei em uma parte da porta de entrada que estava na sombra e esperei. Eu não queria assustar ninguém no meu primeiro dia.

Eu certamente não assustei qualquer um dos homens que vieram pela porta do elevador para a reunião, mas aparentemente irritei muitas das mulheres. As senhoras estavam todas brilhantemente vestidas com tecidos ricos que mal cobriam seus corpos, e cada uma me olhou com inveja quando me entregaram os seus casacos. Tive o cuidado de só respirar por uma fresta da janela aberta para que eu não ficasse demasiado sem controle nesta pequena sala. Servi as bebidas sem respirar nem um pouquinho, e então, com um simples pigarrear da garganta de alguém, a reunião começou. Eu rapidamente peguei o bloco e caneta, e comecei a escrever tudo o que era dito pelos homens impecavelmente vestidos em volta da mesa. Comecei a perceber que estes homens eram membros da indústria e corretores, e que eles estavam compartilhando informações entre si para manipular o mercado em benefício próprio. Isso era muito ilegal, e a perspectiva de ser arrastada para esse mundo clandestino, tanto me assustava como me empolgava. Em minha mente, comecei a planejar o próximo passo que eu faria com meu próprio dinheiro, em resposta ao que eles estavam discutindo. No final, fui devolver os casacos para os homens muito amigáveis e mulheres muito iradas, e depois fui ver Herbert.

“Então, Greta diz que você não tem uma identidade. Você tem vinte anos ou não?”, ele perguntou sem rodeios.

Eu pareço ter vinte anos, eu fervia. “Sim, eu tenho vinte. Meu aniversário é em 18 de março. Eu não tenho identidade, porque eu não precisava de uma em Nashville.” Eu sabia que os nova-iorquinos aceitavam qualquer coisa como normal, desde que se originasse de uma cidade menor. Eu poderia ter, provavelmente, lhe dito que eu era uma vampira, e que todo mundo era vampiro na minha cidade natal, e ele teria apenas dado de ombros.

“Bem, você precisará de uma aqui. Vou te enviar a um advogado que providenciará tudo o que você precisa. Você tem uma certidão de nascimento, ou você nasceu em casa?”

“Em casa.” Poderia ser verdade.

Ele suspirou. “Claro. Então eu vou pagar pela certidão, e você paga por qualquer outra coisa, negócio fechado?”

“Claro, isso seria ótimo. Isso significa que você quer que eu volte?”

“Oh, eu realmente quero que você volte, só consiga um vestido mais elegante. Se você está comigo, você precisa estar no nível máximo com a roupa. Nós nos encontramos duas vezes por semana, mais se necessário, então mantenha as suas noites livres. Ei, você ainda se saiu bem com as anotações”, ele sorriu com aprovação e me entregou $ 100. “Este é apenas o começo do dinheiro para você, se você ficar comigo. O céu é o limite, baby, e você pode ir tão longe quanto quiser.”

Eu sabia o que ele estava dizendo, minha aparência poderia me levar longe neste seu mundo ilegal, e eu não tinha certeza se esta era uma boa ideia, mas estava intrigada com as possibilidades. Com minhas visões, que estavam se tornando mais fortes a cada dia, e as informações dessas reuniões, eu poderia me tornar rica o suficiente para viver da forma como eu quisesse. Isso iria ser uma boa colaboração.

1 comentários:

Sophia disse...

To amando seu livro você escreve muito bem!!!#parabéns

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