Uma semana depois
Estávamos todos reunidos novamente em Monterrey. Após intensas discussões sobre o que deveríamos fazer de hoje em diante para nossa proteção, decidimos bater de frente com o clã do Sul.
Mais cedo ou mais tarde teríamos que fazer isso mesmo. E esperávamos que, quando isso acontecesse, nós consigamos sair inteiros.
Mas... o que não esperávamos era que o combate seria agora! Exatamente agora!
Todos podiam ouvir os estrondos vindos da barreira de pedra que montamos em uma das entradas de Monterrey – o povo daqui é que ficou perplexo por um grande e forte muro aparecer do nada, literalmente do dia para a noite, apesar de em nosso caso ter sido da noite para o dia. E posso afirmar que ninguém entre nós estava contente em saber que nossa pequena muralha estava vindo abaixo com o menos esforço.
“Chegou a nossa hora!” Maria tentou enviar palavras de coragem a todos, mas este trabalho deveria ser só meu, portanto, enviei a todos uma onda de coragem e orgulho. Todos se sentiram bem instantaneamente – inclusive Maria, que estava tremendo de medo, se é que isso é possível em um vampiro. “Vamos.”
Fomos correndo de encontro ao grupo do Sul. Era dia ainda, e pela posição do Sol, eu arriscaria que iríamos batalhar sob um abrasador Sol das onze.
Chegando lá – demos a volta pelo grande muro (só não me pergunte quem foi o boboca o suficiente para ter dado a ordem de quebrar o muro, e não dar a volta...) – e vimos os responsáveis pelos barulhos: dois grandões que, se eu não soubesse que eram vampiros, poderia facilmente confundi-los com uma nova espécie de gigantes.
“O que vocês pensam que estão fazendo?” Maria os questionou. Eles pararam.
“Ora, ora, vejam só quem apareceu!” Ramón disse brincando. “O que estamos fazendo? Bem, estamos conquistando a última das suas cidades, minha querida!”
“Bem, então, me desculpe, mas o senhor terá de voltar outro dia” ela disse corajosa.
“Ah, mas eu prefiro ficar aqui mesmo. Quero Monterrey hoje!”
“Mas por que você quer tanto as MINHAS conquistas? Existe tanto lugar pra você e seu bando.”
“Por que eu quero o que você tem? Hmmm... deixe-me ver... porque você me pertence, queridinha!” Ramón disse, e então todos ficaram assustados, inclusive sua mulher.
“Como assim? Explique-se!” Margarita ordenou.
“Isso, pode se explicar” Maria o encorajou.
“Simples minhas queridas, você quer saber a verdade?”
“Que verdade?”
“A verdade principal de sua existência!” Ramón disse confiante, e animado. E eu estava irritado com ele.
“Não preciso saber disso!”
“Lógico que precisa, todos precisamos.”
“Por que insiste tanto em me contar?”
“Não te lembras de mim?” ele brincou com ela.
“Não. Por que deveria?”
“Dica: eu te conheço há muito tempo Maria. Ainda não te lembras de mim?”
“Não” disse Maria pensativa.
“Pois bem, fui eu quem te encontrou perambulando sozinha, na calada da noite em uma fria e escura noite. Você estava tão desamparada... Não pude te deixar ali, sozinha. Havia homens bêbados por perto, e então percebi a crueldade que eles tinham feito com você!”
“O que eles fizeram comigo?” ela perguntou assustada – até eu estava assustado naquele momento.
“Não sabe minha pequena? Por que nunca perguntou para Francisco lhe dizer?”
“Porque eu sou a líder, e ele me segue, portanto deve obedecer minhas ordens, e uma delas tinha sido a de não se intrometer em meus pensamentos!” ela tentou argumentar.
“Ah, mas seria tão útil que você o fizesse, Maria!”
“Mas eu não quero! E, outra, é você quem está me atiçando para saber. Conte-me você!”
“Sim, contarei. Mas... tem certeza de que não quer saber por ele? Não quer saber o que aqueles monstros fizeram com você pela sua própria mente?”
“Não. Sei” ela disse pausadamente. Após uma pausa, ela retornou. “Eles me transformaram em vampira?” ela disse encabulada, mas ainda assim curiosa.
“Não... pior!”
“O que então?” ela quis saber, mas ele não respondeu, apenas ficou me encarando.
“Francisco?” eu o chamei, e de prontidão, ele já estava ao meu lado. “O que você vê nos últimos dias humanos de Maria?”
Ele pausou e ficou olhando com cara de peixe para o nada. Poucos minutos depois, vi que Maria estava ajoelhada no chão, e estava chorando. Ok, por esta eu não esperava. Vampiros conseguiam chorar... mesmo que Maria tivesse me ensinado que não conseguíamos...
“Ok, já chega!” a abracei e então fiz com que aquela mágoa e remorso do passado fossem encaminhados para o próprio Ramón, que mudou rapidamente de fisionomia. Me levantei e fui até Francisco, que não havia se mexido nem um centímetro. “O que aconteceu?”
Ele pausou pensativamente se era certo me contar ou não, mas então resolveu me sussurrar. “Eles tiraram sua virtude, e depois Ramón a encontrou chorando em um beco escuro chorando. Ele não aguentou e a atacou...”
“Atacou como? Em que sentido, quer dizer?”
“Bem, ele mordeu ela, mas não a levou para ser transformada em outro local, pois achava que ela não resistiria.”
Ok, deixe-me compreender melhor a situação: Ramón transformou Maria, a deixou lá para sua própria sorte, e por alguma razão, agora está querendo tudo o que ela conseguiu. Talvez ele pense que ela deve se juntar ao seu grupo, e por isso está atrás dela.
Ok, desisto. Não sei.
“Está tudo bem Maria?” a indaguei.
“Sim” ela disse se levantando somente agora, “estou bem, bem o suficiente para acabar com a raça deste homem e de todos os seus amiguinhos!” Que linda... ela parecia uma leoa rugindo essas palavras com o máximo de rancor que poderia conter em uma mulher como ela.
“Ora, minha querida, não fale assim com seu mestre!” Ramón começou.
“Você não é meu mestre!”
“Está bem, posso até não ser, mas eu te transformei, você deve me obedecer, não acha?”
“Não, não acho!”
“Hmm... você está complicando demais esses assuntos minha querida. Por que não me entrega logo Monterrey?”
“Porque é MINHA cidade, e não SUA!”
“Mas era MINHA, e não SUA! Agora desista, você vai perder, eu sou mais forte que você!”
“ERA sua, não é mais por ser um incompetente que só foge quando o assunto é lutar por algo seu!”
“Não se faça de inteligente minha querida. Você é apenas mais uma criada minha, e eu sou seu superior, então largue de bobagem e venha para mim. Me entregue a cidade!”
“Nem pensar!”
“Por que você quer tanto Monterrey? É só para ver Maria cair? Qual o gosto disso?” perguntei acidamente para Ramón. Raiva em mim... nele... não, nem tanto...
“Monterrey era uma de minhas cidades antes que os Volturi interferissem. Eu era parte do grupo de Benedito, e fui um dos que tinham uma longa extensão de terra. Mas então, como já lhes disse, os Volturi vieram e acabaram com meu grupo e o de Benedito. Só que eu fui mais esperto e consegui me livrar deles antes de me pegarem. Ninguém mais sobreviveu àquele ataque. Eles fizeram uma excelente limpeza na cidade.”
“Então só quer porque é um suicida?” tentei entender, lógico, que de um modo sarcástico.
“Não se faça de bobo, se eu sou suicida, Maria também é. Ela estava com pouco menos de área do que eu tinha antes. Os Volturi poderiam ter dado uma voltinha com vocês aqui, sabiam?”
“Como assim, voltinha com vocês aqui? O que você quer dizer com isso?” Maria o questionou, e eu percebi que ela estava nervosa pelo mesmo que eu: os Volturi tinham passado por aqui.
“Bem, não se acanhem. Eu sei no que vocês estão pensando, mas não se preocupem, os dois Volturi que estavam por aqui vistoriando nossas batalhas foram mortos” – ok, isso significava um problema muito grande! – “Sim, meus queridos, um dos seus matou um Volturi. E outro retardado meu acabou com outro. E como eles demoraram a voltar, isso preocupou Aro e seus conselheiros, então fez com que a pequena Jane e seu irmão viessem nos visitar posteriormente.”
Todos em transe, quase entrando em pânico. Os Volturi estiveram aqui, e por pouco não nos deram o prazer de conversar com eles.
“Bem, então fizemos bem em deixar a cidade para você, não, Ramón? Creio que Jane e seu irmão devem ter adorado a ideia de rever um antigo ‘amigo’, não?” lhe disse irônico, mas feliz com tudo – afinal, eles pegaram Ramón e seu grupo, não a Maria e a nós.
Eu estava começando a ficar aliviado com tudo isso. Ha!
“Bem, não posso dizer como foi com detalhes o nosso encontro, só posso dizer que foi... animado!”
“Acredito que sim!” Maria disse. “Mas não vou ficar com pena de você pelo que aconteceu. Monterrey é minha, e você não se intrometerá nela!”
“Se os Volturi já viram que é você quem está atrás de tudo isso, por que ainda continua querendo? Querendo Monterrey?” tentei ludibriá-lo.
“Ai ai... é que eu gosto!” Ramón se esquivou. “E sou teimoso o suficiente para que não saia daqui sem Monterrey!”
“Pois então fique o quanto quiser. Fique o suficiente para uma linda e flamejante fogueira!” Maria disse, ao fim olhando para Marcos – que tinha largado Torreón após nossas ordens – para que ele acendesse a fogueira. Ele correu até o muro e arrancou alguns pedaços da madeira rigidamente torcida e entalhada em forma de muro. Pronto! Em poucos segundos uma gigantesca fogueira estava queimando ao nosso lado – nunca subestime o poder de acender uma fogueira dos vampiros!
“Bom, então agora eu faço o quê, já que vocês já acenderam a fogueira? Fico aqui, assim, assistindo?”
“Olhe, você pode também dar um pulinho ali dentro, se quiser!” eu o provoquei.
“Estou mais confortável aqui...”
“Mas não por muito tempo” Maria disse, e então saiu em disparada para cima de Ramón.
O que mais eu poderia fazer nessa hora? Ir junto com ela, claro!
Fui de encontro com um dos gigantes, afinal, Gerardo estava com problemas com ele. Maria estava batalhando com Ramón. Francisco estava lutando com a mulher de Ramón, Margarita. Os demais estavam se enfrentando sem definição, pois eu não conseguia ver quem estava lutando com quem ali – eram muitas pessoas contra muitos, e a situação não me satisfazia...
Conseguimos derrotar um dos grandalhões, e então fomos em direção do outro, que estava quase massacrando Marcos.
Menos um.
Mas, falando desse jeito, a impressão é de que estava fácil e a luta já estava ganha. Pois não estava, em nenhum dos dois pontos.
E... bem... não gosto do que aconteceu...
...
Continuei sentado na ponta da montanha de Monterrey, apenas fixando o horizonte manchado de tons vermelhos e alaranjados. O pôr do sol. Fiquei pensando no que tive que fazer para continuar vivendo, e fazer com que meus colegas também continuassem. Eu realmente não gostava daquilo. Não gostava do que tive que fazer. Do que eu fiz, pois não fui obrigado a fazer nada. Não havia TIVE, apenas houve FIZ.
Minha escolha. Minha determinação. Minha força. Minha monstruosidade. Meu arrependimento.
Prefiro não continuar contando com detalhes, pois esta batalha não me agradou nem um pouco, mas o que posso dizer é: Maria acabou com Ramón e sua mulher sozinha.
Outro detalhe: nos primeiros dezoito meses de vida, eu fui o único a sobreviver a todo esse desastre, esse misto de batalhas, perdas e conquistas.
Vencemos e perdemos muitas.
Mas foi com muito cansaço, esforço e suor – vampiros não soam, e isto é apenas força de expressão – que conseguimos manter Monterrey.
Éramos apenas cinco agora: Maria, Francisco, Lloyd, Gerardo e eu.
Não havia mais ninguém atrás de nós – com exceção da possível volta dos Volturi – e tínhamos apenas Monterrey, a única cidade que queríamos manter. Maria estava aflita em voltar a conquistar as suas áreas antigas, mas soube, mais tarde, que Ramón havia deixado um ou outro de seu clã para tomar conta da região.
Não queríamos interferir mais.
Monterrey era nossa, e essa era a nossa única preocupação: mantê-la conosco.
Mas... por enquanto, tínhamos outro assunto a resolver: éramos apenas cinco, e se alguém destes deixados para trás viesse acertar as contas conosco? Ok, tínhamos de arrebatar mais alguns por aí.
E é isso o que iríamos fazer em breve. Amanhã pela tarde, talvez.
0 comentários:
Postar um comentário