- Você é um vampiro – disse-me Maria, confirmando o que eu já sabia. Eu não podia acreditar nisso. Mas era verdade. Eu havia me tornado uma coisa que eu nunca imaginara que existiria. Eu era um monstro. – Que tal? – prosseguiu.
- Como você pôde? – agora eu estava com raiva, muita raiva. Toda a minha calma havia passado para Maria. Literalmente.
- Era preciso. Se eu não fizesse, Lucy ou Nettie o matariam. E você é muito precioso. Tem um dom. Não percebe?
Eu não conseguia ver nenhum dom nessa minha nova vida. Apenas um dom para matar. Ou então talvez a velocidade... a força...
- O seu controle pelas emoções dos que estão perto de você. Agora mesmo você está me passando toda a sua calma. – Ela me respondeu. Talvez isso até pudesse ser possível.
- Quantas noites eu fiquei...? – perguntei a Maria, que parecia que tinha ficado lá todo o tempo em que eu estive em transe. Eu podia sentir isso.
- Exatamente três dias. Três dias queimando. Três dias em absoluto silêncio, sem movimento algum, apenas sentindo a dor e sem poder fazer nada. Eu sei como é... já passei por tudo isso. – Agora tudo parecia estar mais claro. Eu já estava entendendo quase tudo. Mas apenas uma pergunta ainda estava em minha cabeça. Uma pergunta que até mesmo Maria achava que não havia outra resposta a não ser “sim”:
- Nós só podemos sobreviver matando pessoas? – perguntei.
- Sim. – respondeu Maria, destruindo a minha última faísca de esperança. – Abrimos mão de água e alimentos, mas esse é o preço: sangue humano. Entretanto isso é um pequeno problema comparado a todos os poderes que você ganhou. Força. Velocidade. Sentidos mais aguçados. E esses são apenas alguns deles. Nós somos uma nova arma, Jasper. E é para isso que criei você.
Eu era uma arma. Uma arma letal. Apenas com minhas mãos poderia dizimar exércitos. Ao lado de Maria e de outros de nossa espécie poderíamos acabar com a guerra. Poderíamos salvar mais vidas do que mataríamos para nos alimentar. Juntos.
Olhei para mim mesmo e vi que estava de farda. Mas por quê? Eu não me lembrava ao certo... acho que era um soldado. Um Major ou um Tenente, muito dificilmente, mas devia ser importante. “Se eu não era importante, agora eu sou. Sou importante para Maria.” pensei. Não me lembrava de minha família, todas as lembranças eram borradas e difíceis de enxergar.
Eu podia ver pelas estrelas no céu que daqui a algumas horas o sol iria nascer. Eu queria olhar para o sol mais uma vez com esses meus novos olhos. Lembrei-me de como Maria era bonita e de sua presença e olhei para ela. Ela logo entendeu minha pergunta. Abriu sua pequena bolsa cor de marfim e pegou um pequeno objeto. Um espelho.
Maria ergueu-o para mim. A única coisa que vi nele foi uma outra pessoa. Um homem loiro, com os olhos vermelhos, como os de minha criadora. O único detalhe que me lembrava com clareza de suas companheiras eram os seus olhos vermelhos. Um vermelho impossível de se reproduzir em tinturas, um vermelho vivo. Um vermelho vivo como o dos olhos do homem no espelho. Não pude deixar de notar também como ele era pálido. Mas a sua expressão me fez reconhece-lo imediatamente: era eu. Muito diferente, mas era eu. Sem os olhos azuis, mas tão bonito quanto Maria.
Pensando melhor, essa mudança até que não havia sido tão ruim.
* * *
Maria me mostrou esse novo mundo. Um mundo onde não havia limitações para nossa espécie. Ela me contou que ela, Nettie e Lucy haviam se conhecido a pouco tempo. Eram sobreviventes de batalhas perdidas. Maria queria seus territórios de volta, e queria também vingança. Já as outras, apenas mais humanos lhes interessavam. Elas falavam deles como pastos, e que seu único propósito de existência era para alimentá-las. Nisso eu já não concordava. Só me alimentava em última necessidade, tentando matar o menos possível.
Voltando a Maria, ela estava tentando reunir um exército de vampiros para conseguir o que queria. Mas queria um exército superior, e transformava apenas humanos com “potencial”, se assim posso dizer. Eu era um deles. Ela nos dava muita atenção e treinamento, e ficava ao nosso lado sempre que tínhamos problemas entre nós ou consigo mesmos. Ela nos ensinou a lutar e a nos tornarmos invisíveis aos seres humanos. E quando nos saíamos bem, éramos recompensados...
Ela estava com pressa. Muita pressa. Ela dizia que a nossa força começaria a desvanecer por volta de um ano, e ela tinha que agir enquanto ainda éramos fortes. E quanto mais sangue obtínhamos, mais fortes ficávamos.
Um dia ela me contou que já tinha existido um vampiro que tentou criar um exército como o dela:
- Chegue mais perto, Major Jasper, que vou lhe contar tudo...
1 comentários:
Muito legal !!
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