Singularity - Capítulo 23: O Custo Da Guerra

Pelo restante do inverno, Emily e eu nos conhecíamos devagar, enquanto andávamos para casa ou conversávamos na escola. Ou pelo menos eu a conhecia. Ela falava enquanto eu ouvia porque raramente eu conseguia soltar uma palavra. Era como se ela tivesse segurado todas as suas palavras e as derramava quando estava perto de mim. Era fascinante ver o mundo através dos seus jovens olhos humanos. Estranhamente, ela parecia preencher algum espaço vazio na minha vida que eu nem mesmo sabia que tinha, como algum tipo de irmã mais nova.

Ela se casou logo depois que saiu do colegial. Ela conhecia Tom desde a primeira séria, e durante o ensino fundamental, eles se odiavam. Ela se apaixonou por ele quando eram calouros no colegial, mesmo que ele fosse exatamente o oposto dela, em todos os sentidos. Ele era cinco centímetros mais baixo que ela, e um tanto encorpado. Ele era extrovertido e compulsivo, enquanto ela era tímida e adorava estabilidade. Eu ouvi tudo sobre a infância deles e sobre suas façanhas adolescentes nas nossas caminhadas para casa, e eu fiquei admirada que ele não tenha se matado durante a sua infância áspera. Ele sofreu sete concussões e quebrou vários ossos diferentes onze vezes.

Nós não éramos exatamente amigas, no sentido normal da palavra, mas Emily e eu nos tornamos boas colegas. Ainda que ela fosse dolorosamente tímida entre a maioria dos humanos, ela gostava de conversar muito comigo. Ela parecia ser feita de uma estranha mistura de contradições, e eu gostava da companhia dela tanto pelo companheirismo quanto pela completa ironia da sua vida. Ela era incrivelmente inteligente, mas não conseguia se lembrar de onde colocou coisas como chaves ou trabalhos escolares se disso dependesse salvar sua alma. Ela era espantosamente tímida, mas fez amizade comigo, uma vampira, como se eu fosse apenas mais uma garota qualquer. Ela odiava correr riscos, mas se casou com um homem que parecia não temer a morte ou um desmembramento.

As histórias dela me ajudaram a me conectar com os humanos ao meu redor, e com a desconhecida humana dentro de mim, mais do que qualquer coisa. Eu estava até um pouco triste quando a primavera trouxe o brilho do sol e nossas caminhadas se tornaram menos freqüentes. Eu sabia que não a veria de maneira alguma durante as férias de verão porque ela estaria trabalhando e eu estaria fazendo minhas habituais viagens. Bem, quase habituais. Eu iria ver Cuba e o Caribe. Ivan e seu clã estavam tirando umas pequenas ferias, e eles me chamaram para ir junto.

O ultimo dia da escola foi misericordiosamente nublado, então eu pude fazer meus exames finais facilmente e dizer um adeus rápido à Emily antes que eu tivesse que seguir para o norte para cuidar de coisas inacabadas. Então, era hora de colocar as coisas na minha pequena mochila e me encontrar com os três russos. Nós levamos meu carro até a Flórida, roubando a gasolina que precisávamos, e então nadamos pelas águas quentes do golfo para entrar nas ilhas que queríamos. As ilhas tropicais eram a coisa mais bonita que eu já vi. A água era limpa como cristal, e nós nadamos entre os recifes de corais e pelos navios afundados dia após dia de aventura.

O único problema que nós tivemos foi na ilha do Haiti. Devia haver mais vampiros no Haiti do que em qualquer outro lugar no mundo, além de Volterra. Com tantos vampiros vivendo juntos, eles se tornaram muito violentos e territoriais. Sinceramente, territorial é um eufemismo em uma ilha como o Haiti, onde a população humana é limitada. Os vampiros que nós encontramos eram quase paranóicos com a necessidade de proteger sua quantidade escassa de humanos. Nós fomos desafiados duas vezes na ilha por um clã menor, e mesmo que nós os tenhamos alertados, eles não nos deixaram escolha a não ser destruí-los. Os clãs da ilha absolutamente não eram desafio para os irmãos russos – de fato, os dois estavam chateados com a facilidade que lidamos com eles. Homens típicos. Eles não apenas gostavam de lutar, mas eles preferiam as possibilidades de derrotá-los. Eles eram quase suicidas nesse ponto, preferindo a posição de oprimido todas as vezes.

As ilhas menores e Porto Rico e Cuba eram muito mais acolhedoras. Nós até nos juntamos à uma festa de vampiros em Cuba, que foi dada por um casal muito amigável. O único ponto baixo da festa era que a piñata enorme foi cheia com três humanos. Eu tentei não ser rude quando eu saí rapidamente da festa antes que a brincadeira da piñata começasse.

Ao todo, meu verão foi relaxante e maravilhoso, assim como um verão tem que ser. Eu cometi dois deslizes, inteiramente por acidente, quando eu tentei caçar em uma ilha menor. Haviam muitos humanos por perto, e pouco espaço. Eu me senti horrível pela perda deles, mas foi realmente um engano. Mesmo assim, eu me enchi de ursos e leões da montanha nas Smokey Mountains, antes de voltar à rotina maçante da escola. O clã do Ivan ainda pensava que eu estava doida por voltar, mas se eles soubessem o quão doida eu realmente sou, eles não teriam me convidado em primeiro lugar.

Emily quase me abraçou quando as aulas recomeçaram. Quase.

“Oh, Alice, eu senti tanto sua falta. Eu tenho tanto para te contar sobre o que Tom está fazendo, e o que meus irmãos estão fazendo, e sobre o trabalho do meu pai…” E lá foi ela. Eu nem mesmo tive que mentir sobre onde eu estive por todo o verão, eu apenas acenei e sorri e me diverti com a humana estranha que podia ver tanto em um rosto e tão pouco em uma pessoa. Ela ansiava por seu marido, seu melhor amigo desde a infância, e eu ansiava por um vampiro que eu nunca encontrei. Parecia tão estranho que nossas vidas fossem tão similares quando o assunto era a dor da perda, mesmo que nossos mundos fossem totalmente separados, nós éramos parentes de espírito.

E assim foi. Eu caminharia para casa com Emily parte da semana, e nós estudaríamos juntas na biblioteca nas noites de terça. Ela era uma enfermeira chefe, e eu era agora uma veterana em arte e design, com uma decente média B. Isso era idéia do Dr. Hendrick. Ele me alertou contra se tornar a melhor aluna.

A família da Emily estava até confortável na minha presença, apenas o cachorro continuou um inimigo hostil. Eu realmente não gostava daquele cachorrinho. Ele não era nada além de um tufo de pelos demoníaco com uma aversão perversa de meias e saias. Leões e leopardos fugiam na minha presença, mas esse pequeno diabinho não tinha problemas em morder minhas pernas e tornozelos todas as vezes que eu vinha. Precisei de todas as minhas forças para não chutar aquele cachorro direto até a próxima cidade.

As curtas caminhadas para casa com Emily eram importantes para a minha vida aqui. Ela me falaria sobre a sua infância e seus sonhos, e eu ouviria e imaginaria o que minha própria vida teria sido. Eu ia me divertindo com suas divagações até que chegávamos perto da casa dela e o pequeno cachorrinho do diabo faria um tremendo escândalo e nós tínhamos que parar de falar.

“Eu apenas não sei o que deu nele,” ela diria enquanto tentava agarrar a bola de pelos que se contorcia, e arrastá-la para dentro do quintal rosnando e se chorando ao mesmo tempo.

“Não se preocupe,” Eu diria todas as vezes, e então daria uma olhada e um rosnado baixo para o animal, que o mandariam tremendo para os braços dela. “Cachorros não costumam gostar de mim.”

Eu tinha que admitir, sendo tão pequeno quanto um esquilo, o cachorro parecia tremendamente corajoso.

Enquanto minha vida se seguiu como de costume – visões, trabalhos de casa, visões, caçar, visões, compras – eu me senti sendo separada. O lado humano desejava o cotidiano normal de uma vida de estudante. Jogos de futebol, baseball e basquete, bailes, e estudar me atraíam para a humanidade. O corpo estudantil não era exatamente amigável a meu respeito, mas eles não se encolhiam quando eu aparecia nos jogos ou bailes. Bem, eles se encolhiam, mas só quando eu gritava. Eu sou muito competitiva. Eu gostava tanto da vida de universitária que eu até me encontrei querendo me juntar à uma irmandade.

O lado vampira, ainda assim, queria sair e correr, dar festas extravagantes, fazer compras nas lojas mais finas, e se vestir e sair para uma noite na Broadway, onde eu poderia atrair olhares. O lado vampira pensou que se juntar à uma irmandade era uma idéia muito boa.

Eu gastei a maior parte do meu primeiro ano tentando encontrar equilíbrio entre viver tanto como predador quanto como presa. Para isso, eu tentei ver o clã do Carlisle o mais frequentemente que eu pude. Elas normalmente eram visões muito embaçadas, mas cada uma ajudou um pouco. Edward e Rosalie estavam os dois em algum tipo de escola, e me fez me sentir muito melhor vê-los em salas de aula, como eu. Edward já esteve em escolas antes e sempre parecia estar entediado e desdenhoso, mas eu não podia realmente dizer se a Rosalie gostava ou não da escola. O rosto dela estava sempre preenchido com desprezo, mas essa era a aparência normal dela. Só ela podia fazer olhares frios ficarem bonitos.

Carlisle estava trabalhando em um hospital, mas eu tentei não vê-lo. Eu não precisava ver todo aquele sangue nem mesmo em uma visão quando eu estaria cercada por corações batendo no dia seguinte.

Esme estava constantemente pintando ou martelando alguma coisa. Ela estava feliz, mas parecia sinceramente boba com o enorme cinto de carpinteiro e segurando aquelas ferramentas. Ela precisava desesperadamente de um novo guarda-roupas.

Na maioria das vezes eu vi Edward e Emmett lutando ou correndo. Emmett continuava experimentando esportes que não eram direcionados para vampiros. Ele destruiu um conjunto de clubes de golf e uma boa parte do que parecia ser um country club. Então, ele foi e destruiu várias raquetes de tênis, despedaçou uma rede, e destroçou dúzias de bolas de tênis inocentes. A quadra parecia a superfície da Lua quando ele terminou. Pelo menos o ringue de hóquei era um lago ao ar livre, então ele não podia causar muitos danos, ainda que ele tenha destruído várias árvores e reduziu os bastões de hóquei à estilhaços. Ele ainda destruiu completamente uma quadra de basquete interna. Destruir coisas parecia ser fácil para ele. Edward apenas assistia tudo com um olhar de diversão que era estragado de alguma forma pelo seu constante tom superior e olhar pretensioso. Ele realmente precisava saber que ele não era o único vampiro com um dom na Terra. Eu esperava surpreendê-lo algum dia e abaixar um pouquinho sua crista. Isso seria divertido.

Enquanto eu me dava bem, e aproveitava quase todas as partes da minha vida, foi um inverno longo e difícil para Emily. Tom foi para uma missão e não pôde escrever com muita freqüência ou muitas vezes. Muitas das cartas que ele mandava eram pesadamente censuradas. Emily estava além de preocupada, mas ela mantinha uma aparência corajosa enquanto os meses passavam. Para mim, eles passaram rápido, mas eram arrastados para ela.

Em Abril, as cartas de Tom tomaram um rumo menos censurado e mais otimista. Enquanto andávamos para casa no dia 22 de Abril, o dia estava quente e alegre abaixo das nuvens baixas, e a mudança das estações ajudou a colocá-la em um humor melhor. Ela estava perto de estar feliz hoje, e o seu cabelo curto balançava com o vento enquanto caminhávamos. Nós conversamos sobre as aulas, o jardim vitorioso de seus pais, as últimas catástrofes de seus irmãos, e qualquer outra coisa que evitasse falar da guerra.

“Eu acho que o professor Brighton não gosta de mim,” ela falou franzindo.

“Todos gostam de você,” eu respondi. E era verdade, todo mundo gostava dela. Era um tanto chato que alguém tão quieta e modesta fosse tão popular. A única que não sabia disso era a Emily.

“Ele continua escolhendo meus trabalhos para revisar,” ela reclamou. “Eu não sei porque ele não pode escolher outra pessoa, só pra mudar. Eu sei que eu nem sempre faço o melhor nas aulas, mas eu realmente tento. Ele continua dizendo que meu trabalho tem vários erros comuns e que ele usa para corrigir o dos outros. Que tipo de professor continua escolhendo a estudante lenta?”

“Talvez ele apenas quer que você melhore,” eu falei. Ela realmente era uma esturante brilhante, e eu tinha certeza que sua média A não estava em risco algum.

“Talvez eu pudesse melhorar se ele tentasse me ajudar ao invés de apenas apontar o que eu fiz errado,” ela respondeu com um beicinho.

Só então, nós viramos a esquina para a rua dela, e ambas congelamos. Um grande carro preto estava parado em frente à sua casa. O carro pertencia ao seu pastor, e havia apenas uma razão para ele estar lá.

A visão veio com uma clareza perfurante. Eu podia ver o pastor dela lá dentro, conversando com os pais. Sua mãe estava soluçando, e uma das mãos de seu pai segurava uma pequena folha de papel, enquanto a outra cobria seu rosto pálido.

Nenhuma de nós se moveu, e eu não pude dizer nada por alguns instantes. Eu sabia em que nós estávamos entrando, e eu não poderia levá-la ao seu pior medo. Senti as mãos dela agarrando meu braço, mas eu ainda não conseguia me mover. Eu precisava de tempo, eu precisava estar pronta para ajudar esta menina frágil a passar por isto.

“Alice?”, Ela sussurrou com a voz trêmula. Ela sabia o que o carro significava para ela. As mãos dela no meu braço agora estavam também tremendo. Ela não seria capaz de enfrentar isso sozinha.

Eu respirei fundo e comecei a caminhar lentamente para a casa dela, arrastando-a atrás de mim. Eu não queria entrar naquela casa, e cada passo se tornava muito mais difícil do que o anterior. Parecia estranho ser tão forte e ainda assim ter pesos puxando minhas pernas para trás. Ao meu lado eu podia sentir o terror de Emily crescendo exponencialmente. No momento em que chegamos na porta da frente, ela estava tremendo demais para andar. Segurei ela de pé e a apoiei na entrada.

Foi realmente há apenas dois minutos atrás que ela estava preocupada com um professor malvado?

Todo mundo olhou para nós assim que entramos. Por alguns segundos eternos, ninguém se moveu nem disse nada. Então, de repente, a mãe dela estava ao seu lado, segurando-a como uma criança pequena e dizendo: “Emily, minha pobre Emily”, mais e mais enquanto Emily começou a soluçar.

Mais uma vez, eu estava em uma casa marcada pela tristeza. Não era minha dor, mas senti como minha própria, enquanto eu observava a cena diante de mim.

Seu pastor de cabelo branco se aproximou e começou a esfregar suas costas. Emily apenas estremeceu mais e se enterrou em sua mãe. Seu pai veio para ajudar a segurar a sua filha. Ele parecia que estava tentando protegê-la de alguma forma da dor inevitável.

“Como … como … foi …?” Emily tentava colocar as palavras para fora, mas sua respiração partida e os soluços esmagadores não a deixavam.

Seu pai abriu o telegrama amassado. Eu poderia decifrar as palavras iniciais, “Lamentamos informar …”

“Itália, ele estava na Itália tentando romper as defesas inimigas. Ele foi morto a tiros,” ele disse densamente em uma voz de luto.

Os soluços de Emily começaram a vir em uma forma mais rápida, e ela começou a chorar em uma alto lamento. Eu percebi que ela estava ficando histérica e seria necessário acalmá-la rapidamente ou ela poderia desmaiar.

O pastor também deve ter percebido isso, e ele a pegou dos braços de sua mãe e levou-a para o sofá para se deitar. Ela se enrolou em uma bola e continuou a chorar enquanto sua mãe segurava suas mãos ou corria os dedos pelos cabelos curtos de Emily.

“O que faremos agora?”, perguntou a mãe dela com a voz falhando. “O que fazemos sobre os pais dele?”

“Eles já foram notificados”, sussurrou o pastor. Gostaria de saber quantas vezes esse velho senhor tinha ajudado famílias a passar por isso nos últimos dois anos.

O pai de Emily assentiu lentamente retornando para o lado de sua filha.

Uma voz pequena vinda da parte de trás da casa disse, “Papai, o que está acontecendo?”

Os meninos estavam de volta da escola, e o pai saiu para confortar seus dois filhos.

Eu estava esquecida no hall, e eu fiquei assim até a noite. Emily estava exausta, eu poderia dizer pela sua voz fraca, mas ela continuou a chorar no sofá. Eu sabia que ela precisaria de comida e água de algum tipo e, em breve, então eu fui pegar um copo na cozinha. Alguém já tinha trazido uma caçarola que estava intocada no balcão. A vizinhança já tinha ouvido a notícia agora, e a igreja deles também. Peguei um prato e coloque uma porção nele para levar para a mãe de Emily, e equilibrei dois copos cheios na outra mão.

Quando toquei no ombro de sua mãe, ela começou.

“Oh, Alice, muito obrigada por ficar”, disse ela com os olhos desnorteados.

“Há uma caçarola na cozinha, eu disse, “Eu lhe trouxe um pouco. Você deveria comer alguma coisa. “

“Os meninos já comeram?”, ela perguntou rapidamente assim que se levantou com as pernas pouco firmes.

“Não sei,” eu respondi assim que entreguei o prato. “Coma isso e vou encontrá-los.”

Os meninos estavam em seu quarto ouvindo o rádio, mas não escutando nada. Nenhum deles tinha comido, então eles me seguiram agradecidos até a cozinha onde eu peguei porções enormes e lhes entreguei. Eles comeram em silêncio na mesa. Eu os assisti e fiquei por perto no caso deles precisarem de alguma coisa, embora ambos os meninos terem idade suficiente para se arranjarem sozinhos.

“Ela vai ficar bem?” Perguntou o mais novo depois de terminar de comer.

“Não essa noite,” eu respondi o mais honestamente que eu pude. “Vai levar muito tempo, mas ela vai ficar bem. Deixe-a ter seu tempo para ficar triste, e seja bonzinho com ela.”

Ela vai ficar bem com o tempo. Não nessa tarde, nunca do mesmo jeito, mas ela era forte e tinha uma família adorável, e ela ficaria bem algum dia. Eu invejava sua humanidade e uma fraca memória que oferecia uma proteção tão maravilhosa. Quantas vezes eu desejei poder esquecer apenas por um tempo tudo o que eu tinha perdido e o que eu ainda não tinha encontrado?

“Alice,” chamou a mãe da Emily, “você poderia se sentar com ela um pouco para que eu possa por tudo em ordem e dar janta aos garotos?”

“Eu os alimentei, mas eles poderiam usar uma boa conversa agora,” eu disse à ela enquanto entrava de volta na sala de estar. O copo estava vazio, e eu estava contente que a mãe dela tenha sido capaz de fazer Emily beber alguma coisa. Eu sentei perto da cabeça da Emily e passei a mão nas costas dela, com cuidado para não tocar a pele dela com minhas mãos geladas de pedra.

O pai dela entrou e me observou com cautela por alguns minutos. Ele era um pai bom e protetor, e eu sabia que seus instintos o avisariam de que essa cena era de alguma forma muito errada, mas ele simplesmente observou sem interferir.

“Você pode levá-la para a cama?” Ele perguntou por fim, com uma voz cansada.

“Eu acho que sim. Você precisa ir comer. Há uma caçarola na cozinha.”

“E quanto à você Alice? Você comeu?”

“Eu comi com os meninos,” eu menti. Ele acenou e andou devagar para a cozinha, ainda me observando. Eu ajudei Emily a se levantar e a levei para o quarto, quase carregando-a. Ela não respondeu de jeito nenhum, ela apenas andou rigidamente para a cama dela e desmoronou. Eu não andei desse jeito na quente cidade marroquina? Eu me encolhi com a memória de dor e o conhecimento de que Emily estava agora sentindo isso tão profundamente. Eu me sentei na cama com ela e continuei acariciando suas costas.

A mãe da Emily entrou no quarto um pouco antes da meia noite. Ela nem mesmo pareceu se importar que eu estivesse confortando Emily, ela apenas parecia cansada e perdida, como uma garotinha que não sabia onde estar ou o que fazer. Eu não conseguia imaginar a dor dessa mãe vendo a filha dela passando por isso.

“Não se preocupe, Sra. Peterson, eu vou ficar com ela essa noite, e eu virei todas as noites até que ela melhore. Eu não me importo nem um pouco de ficar durante a noite,” eu disse para as perguntas não feitas em seus olhos.

Ela olhou para mim e para Emily com seus olhos vermelhos e inchados e acenou. Ela estava exausta, e quase desmoronando. Ela murmurou um silencioso “Obrigada,” e foi para a cama. Eu esperava que ela conseguisse dormir e descansar essa noite, mas eu duvidava que qualquer coisa seria repousante para essa família por um bom tempo.

Eu me sentei com Emily assim como fiz com a Myrtle há tanto tempo. Era tão doloroso agora quanto foi naquela época. As lembranças da perda voltaram. Eu estive lá quando três outros amigos morreram. Eu imaginei se algum outro vampiro era tão masoquista assim para se permitir passar por isso. Era completamente idiota. Imortalidade e mortalidade não poderiam se misturar. Dr. Hendrick estava certo; eu não deveria tentar tanto ser humana.

Emily finalmente chorou até conseguir dormir por volta das cinco, e eu a cobri com seus vários cobertores antes de sair. Estaria frio e insuportavelmente ensolarado, e eu não podia ficar. Enquanto eu passava pela porta, eu vi que alguém já tinha colocado sobre a estrela uma cortina preta pelo luto. Eu odiava essa guerra com uma força que me esmagava.

Quando eu andava pelas ruas que me levavam à minha pequena casa, eu podia ver outras estrelas brilhando nas portas, como faróis. Cada uma representava uma vida, amor, esperança, um futuro, e uma perda imensurável.

Levou quase uma semana, e um vidro de tranqüilizantes, mas Emily voltou um pouco à vida. A estudante feliz se foi agora, e eu duvidava que um dia ela retornaria.

Emily largou a escola pelo restante do ano, mas me prometeu que ela voltaria para terminar sua formação. Eu iria ajudá-la com isso, desde que eu completaria meu ano final no outono.

Para garantir seu retorno, eu anonimamente doei dinheiro suficiente para pagar o restante das suas despesas de faculdade e possivelmente dos seus irmãos também. A escola iria avisar à ela sobre seu novo estado financeiro. Era tudo o que eu realmente podia fazer por ela.

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