Eu estou com febre, muita, muita febre! Estou quente, muito, muito quente!
Os passos pararam em frente ao meu quarto, e então não demorou muito para que a porta de meu quarto se abrisse. Pude ver que foi mamãe quem abriu a porta, e ela estava nervosa, preocupada, eu podia ver isso pela expressão em sua face.
Eu me odiaria por isso mais tarde. Como é que eu pude preocupar minha linda mamãe? Tão doce, tão carinhosa e atenciosa.
Assim que mamãe se movimentou para dentro de meu quarto, pude ver o doutor também. Eu gostaria que ele não viesse ao meu quarto. Melhor, que ele nem existisse – doutores medicam a gente e tem vezes que dão injeções na gente. Espero que febre não se encaixe no quadro ‘injeção’.
Este doutor era estranho – Há, como todos os outros. Ele tinha estatura baixa, um pouco abaixo da de mamãe. Não era magro, mas também não era demasiadamente roliço. Tinha cabelos negros e finos, mas ao canto das pestanas, eu conseguia ver o surgimento de alguns fios prateados.
Sua expressão não era nem de preocupação nem de raiva. Era de nada, a que os doutores sempre tem. Creio que quando eles estudam, eles devem ter uma matéria apenas para ensiná-los a encarar os problemas sem fazer caretas para os pacientes. Imagina como um paciente que levou um tiro na perna e que precisa amputá-la iria ficar se visse a cara de assustado e nojo do doutor?
Ele entraria em pânico. E creio que eu também entraria. Como estou quase entrando agora – claro, sem a necessidade de amputar a perna. Espero!
Ele estava vestindo uma calça de cor escura e uma blusa de tonalidade azul por baixo de uma grande capa branca – um grande casaco, eu diria. Ele estava com um grande instrumento de ferro brilhante ao redor de seu pescoço. Não sei o nome daquilo, se é que aquilo tem um nome. Coisas estranhas não deveriam ter nome, muito menos existir. Confundir a mente das pessoas não é engraçado.
“Querido, este é o doutor Nicholas Fields. Ele veio para examinar você. Não se preocupe, não vai doer nada!” mamãe disse, tentando me acalmar – mas eu não estava preocupado nem nervoso. Acho que a minha expressão de doente passava isso, ou ela apenas disse para acalmar a si própria – algumas pessoas fazem isso para se confortar.
Ele me cumprimentou com um simples gesto de cabeça, e depositou sua pequena mala branca no chão, ao lado de minha cama. Ele estava ao meu lado e começou a me examinar. Me pôs a mão na testa, nas bochechas e garganta. Ele ainda me pediu para fazer coisas estranhas – o que eu disse que coisas estranhas não deveriam existir?
Ele pediu para olhar seu dedo – ele é doido? –, para olhar para cima e para baixo, e quando eu fazia isso, ele puxava minha pele na direção oposta – o que ele estava procurando por lá? Ele ainda, não contente por ter me feito de idiota em frente à mamãe, me pediu para que abrisse a boca falando ‘a’. Mas um ‘a’ prolongado. Ok, ele não era médico. Eu estava com febre e ele estava procurando outras coisas em mim. Será que ele não percebeu isso ainda?
Após este procedimento, ele abaixou o lençol e começou a apalpar meu abdômen, apertando-o um pouquinho. Foi divertida esta parte, sentir sua mão entre os meus ossinhos do abdômen me fez cócegas.
Minutos depois, ele tornou a pôr a mão sob minha testa. Finalmente o veredicto final:
“Sim, senhora Whitlock, o pequeno Jasper aparenta estar com febre, e febre alta. Eu lhe recomendo descanso, que tome muita água, e assim que possível, um banho em água morna. Assim que a febre abaixar, ele está livre para fazer o que quiser pelo resto do dia” finalmente ouvi a voz em alto e bom som do doutor Fields.
“Tudo bem, então doutor Fields. Muito obrigada pela visita” mamãe disse grata olhando para o doutor maluco em meu quarto. O doutor se levantou, juntou seus pertences – que nem usou, graças a Deus! – e foi embora acompanhado de mamãe – antes que mamãe fosse embora junto com o doutor, ela veio até mim e me deu um discreto beijinho. É, essa é minha mãezinha. Tão atenciosa e carinhosa, como sempre!
A porta se fechou e eu pulei da cama. Tirei as meias e as coloquei dentro da pequena bacia debaixo de minha cama. Não queria fazer isso, mas não resisti. Tive de cheirar meu pé para saber qual seria o cheiro que ele estava.
Para meu encanto, ele até que não estava cheirando tão mal assim. Tinha apenas o cheiro desagradável do alho, mas para isso, bastava apenas pôr outra meia e um sapato para que o cheiro ficasse preso ali embaixo, bem longe de meu nariz.
Corri para a porta, e a abri o suficiente para ouvir o que mamãe estava conversando com o doutor. Para minha infelicidade, eu não ouvi nada, o doutor já tinha ido embora. A única coisa que escutei foram passos subindo as escadas novamente. Rapidamente fechei a porta com o máximo de silêncio que pude, e corri de volta para a cama.
A porta de meu quarto se abriu, mas era Noah. Ela veio preocupada me perguntar como minha atuação tinha se saído.
“Como foi, pequeno Jasper? Correu tudo bem?”
“Sim, claro. Eu te disse que você não tinha a necessidade de se preocupar comigo, tudo sairia e saiu muito bem. Estou de repouso até minha febre passar.”
“Sim, eu sei, e sua mãe me mandou para cuidar do senhor. Ela disse que, como nos damos muito bem, seria melhor que ela cuidasse do Bryan, e eu do senhor.” Eu adorava ficar perto de Noah, minha segunda mãe. “Você já tirou as meias?”
“Sim, e meus pés estão cheirando a alho, estão cheirando mal, muito mal.”
“Onde o senhor pôs as meias?”
“Dentro da bacia, embaixo de minha cama.”
“Tudo bem, depois eu as tiro e as lavo. Mas por enquanto, o senhor vai me esperar preparar seu banho e...”
“Ah, banho?”
“Sim, senhor. Assim será melhor: o senhor vai poder mostrar a sua mãe que sua febre já abaixou e tirar o cheiro de alho dos pés. Uniu o útil ao agradável.” Se é útil, então tudo bem...
Noah saiu de meu quarto, mas logo voltou dizendo que meu banho já estava pronto. Fui para o outro quarto ao lado do meu, e vi que a banheira já estava com bastante água. Me sentei lá, e fiquei por algum tempo.
Assim que meus dedos ficaram enrugados, decidi sair de lá. Mamãe veio até mim com uma toalha seca e macia, para me enxugar, o que ela me ajudou a fazer. Ela ainda me vestiu, penteou meus rebeldes cabelos, e me deu um beijinho na testa, dizendo que estava feliz por me ver livre da febre.
Também disse que, a dor na barriga de Bryan passou rapidamente, e que provavelmente era apenas algo que ele havia ingerido e não lhe fez bem. Ele não tomou injeção, assim como eu, mas não ficou livre daqueles exames escrotos.
Deste modo, mamãe me disse que ambos, Bryan e eu, estávamos livres para fazer o que quisermos. Esteticamente, procurei me mostrar o mais neutro possível, apenas consenti com uma leve expressão de alívio no rosto. Por dentro, comemorei muito, com gritos e urras.
Caminhei de volta para meu quarto, até ouvir os passos de mamãe desaparecer pelas escadas. Assim que o houve, corri para o quarto de Bryan.
“Jasper, não acredito que você me fez de idiota? O doutor infeliz me fez de trouxa o tempo todo, em todo o exame!” Bryan não estava feliz com a situação – mas ele já estava se vestindo, só falta abotoar o colete, quase pronto para brincar.
“Eu sei, também passei por aquilo. Foi ridículo. Eu estava com febre e ele estava procurando coisas nos meus olhos, garganta e barriga!” afirmei. Bryan riu com isso, e disse: “Comigo também!!!”
Nós ficamos dando altas gargalhadas com a situação em que nos metemos apenas para brincar, e não ir para a casa da vovó. Mamãe subiu e nos disse que nós deveríamos brincar pouco, sem muitos esforços, e que ela iria para a casa de vovó.
“Tudo bem mamãe, ficaremos bem por aqui, e não desobedeceremos a senhora” lhe disse. Sua expressão se tornou mais uma vez adorável, e ela fechou a porta e foi embora.
Eu e Bryan resolvemos ir para o quintal para brincar – eu já não queria mais brincar de guerrinha. Havia outros jogos mais divertidos. Mas assim que saímos, vimos uma fila de belas mulheres de pele escura, muito bronzeada pelo sol. Bryan, instantaneamente, começou a se exibir para elas. Ele fazia pose, mandava beijinhos, e algumas até respondiam com outros beijinhos.
“Eu não vou ver você se exibir pra um bando de garotas, isso é ridículo, mais ridículo que o nosso exame ridículo.” Eu realmente não gostava de quando ele fazia isso. Até por que papai e mamãe já estavam procurando por sua noiva, e estava quase certo de que seria a bela Joanna Radle – uma pequena e encantadora menina ruivinha de olhos verdes como duas pequenas esmeraldas.
“Ah, por favor Jasper... eu só faço isso por que eu gosto, não vou me apaixonar por nenhuma delas.” Apaixonar? Acho bom mesmo, papai não iria gostar nem um pouco de saber que seu filho estava apaixonada por uma escrava. “É o amor que eu mostro em exibição para elas, Jasper. Aprenda comigo e tenha as mulheres aos seus pés. Todas irão querer tê-lo como marido!”
Ughh... marido? Amor? Na minha idade, o amor ainda é uma grande surpresa, uma grande caixa embrulhada com um forte papel e lacrada por sete chaves. E além do mais, é uma surpresa que prefiro deixar em mistério por um bom tempo!
“Se papai souber que você gosta de uma delas, ele vai te matar, papai vai te matar... é sério, vai mesmo.”
“Já disse que não gosto de nenhuma delas, o que gosto é de me mostrar para elas.”
“Você é louco. Bom, esquece isso. Vamos brincar?” propus.
“Sim, isso já está ficando chato, mesmo! Vamos brincar de pega-cowboy.”
“Ok, com quem está?”
Ele, rapidamente, bateu em meu braço e saiu correndo, gritando:
“Com você, é claro!”
Corremos um atrás do outro a tarde toda, com esperanças de que mamãe não soubesse disto. Mas, de repente, Bryan sumiu. Simplesmente, desapareceu. Continuei a correr, procurando por ele. Aos poucos, ouvi alguns gritos baixos, como se viessem de longe. Quanto mais eu corria em direção a este grito, mais ele ficava alto.
De súbito, parei na beira de um grande buraco. O reconheci sendo a nossa fonte de água aqui da fazenda, o nosso poço. O grito vinha de lá de dentro. Reconheci, então, coisa pior. Os gritos eram de Bryan. Tive apenas uma reação: correr procurando por socorro.
1 comentários:
sera q o irmão do Jasper vai morrer??:(
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