Solitário - Capítulo 08: Fundo Do Poço

Corri o máximo que pude gritando por socorro. Pulei todas as inconstâncias do terreno do quintal, passei raspando por todos os pequenos arbustos que estavam nascendo por ali. Percorri uma linha reta até o ponto em que papai estava – ele era forte e inteligente, saberia o que fazer.

Cheguei ao papai ofegante, e derrapando quando tentei parar.

“Papai... Bryan... poço... caiu...” tentei falar, mas a falta de ar parecia estar mais presente e constante.

“O que foi meu filho? Não vê que seu pai está ocupado?” papai começou, ele não havia compreendido o grau da situação em que estávamos.

“Bryan... poço...”

“O que tem o Bryan com o poço, Jasper? Ele gosta daquele poço, ele ficava sentado na beirada jogando pedrinhas para ouvir o som da pedra ao encontrar com a água lá no fundo” disse papai, rindo.

“Não... socorro...”

“Jasper, acalme-se meu filho...” papai me disse, mais sério, pondo as mãos em meu tórax para que eu pudesse respirar. Me apoiei com minhas mãos, uma em meus joelhos, outra nos ombros de papai, que agora estava ajoelhado ao meu lado.

Tentei recomeçar, explicar toda a situação para que ele entendesse o quão em perigo Bryan estava.

“O Bryan, pai. Ele... não estava sentado... a gente estava brincando, e ele caiu...”

“Cair todo mundo cai, meu filho. É só levantar!” E papai levantou-se impaciente, sua benevolência indo embora.

“Não tem como levantar! Caiu no poço!”

No momento em que eu repeti pela milésima vez ‘poço’, ele entendeu. Como já estava se virando contra mim, virou sua cabeça em minha direção de uma forma brusca, aterrorizado. Seus olhos esbugalhados com a notícia.

“No poço, Jasper? Pelo amor de Deus, minha santa Texiana. Merryl, por favor, vá agora mesmo me buscar a corda mais comprida que você encontrar. Mande outros lhe ajudarem a buscar uma corda o quanto antes!” Papai se desesperou.

Antes que eu pudesse perceber, eu já estava correndo de novo, agora com papai até o poço onde Bryan tinha caído.

“Bryan, meu filho? Você está aí?” Havia terror em sua voz, e eu estava me sentindo como se uma parte de mim estivesse ali embaixo também, como fosse eu quem estava lá, sentindo frio, medo, pânico...

“Paaai..” Bryan conseguiu responder em meio a alguns barulhos estranhos, acho que ele estava começando a perder forças.

“Bryan, meu filho, pelo amor de tudo o que lhe é mais sagrado, por favor, continue nadando. Você está bem? Está me escutando bem?”

“Estou escutando bem, e estou me segurando em uma das pedras do poço. Aqui embaixo não é muito bonito, sabe!?”

“Agora não é hora de brincadeiras Bryan! Continue se segurando, não solte, não solte!” Papai ainda estava desesperado – eu também.

Merryl, um dos escravos de patente maior aqui na fazenda, voltou correndo até meu pai com uma corda muito longa, que estava enrolada.

“Sr. Joseph, apenas encontrei esta como sendo a maior. As outras são pequenas” – ele também estava nervoso, desesperado.

Papai não pensou duas vezes, pegou a corda das mãos de Merryl e jogou ao Bryan, dizendo:

“Filho, não se preocupe, estamos lhe jogando uma corda. Cuidado! Olha, lá vai ela!” E a jogou.

“Pai, eu não alcanço a corda, ela é muito curta, eu não alcanço...” Bryan disse, e eu percebi que ele estava começando a se desesperar, assim como papai e Merryl – e eu.

“Merryl, arranje outra corda, não sei onde, mas arranje. Dê nós para juntá-las. Dê um jeito!” papai disse, a última frase sendo gritada com dor em sua voz. E Merryl saiu correndo novamente.

Todos estavam nervosos, mas ainda conseguiam falar. Onde estava minha voz? Onde ela foi parar? Eu estava com tanto medo de perder a minha outra metade, ainda mais num lugar tão perto de onde eu estava. Eu estava apavorado.

“Jasper, vá chamar sua mãe! Agora!”

Apenas concordei com a cabeça, sem dizer uma palavra em resposta. Tentei me levantar, apenas consegui cair um pouco para frente. Tentei novamente e consegui, apesar de sentir as pernas como se elas tivessem sido anestesiadas. Meus joelhos, praticamente, não existiam. Eu não sentia absolutamente nada do pescoço para baixo. Tudo se movia apenas com movimentos involuntários, por que tudo em meu corpo sabia que Bryan precisava de mim, e eu precisava de Bryan.

“Mamãe? MAMÃE?” entrei gritando pela porta dos fundos, a porta da cozinha. Noah estava lá sentada fazendo alguma coisa.

“Calma, querido Jasper. O que aconteceu para estar tão afobado assim?” Noah perguntou calma – por enquanto.

“Foi Bryan. Ele caiu no poço. A gente precisa de corda. Corda. Corda grande. Onde está mamãe?”

“Minha Virgem Maria. Sua mãe foi à casa de sua avó, se lembra? Vocês já conseguiram as cordas?” ela perguntou nervosa.

“Não, uma era não grande o suficiente. A gente precisa de ajuda, de ajuda!” Comecei a entrar em pânico, minhas pernas tremendo, e eu sem saber o que fazer. Comecei a girar lentamente no mesmo lugar, o pânico apenas crescendo gradativamente em mim. Pus as mãos em minha cabeça, em meus olhos, e as tirei, esperando que tudo aquilo fosse apenas um mau pesadelo, um terrível pesadelo. Mas não era!

Era realidade. Tudo era real. Meu irmão estava em perigo de verdade. Senti minha visão se embaçar, e percebi que meus olhos estavam cheios de lágrimas, que transbordavam sem parar. Não havia som de choro, havia apenas som de desespero, de uma tragédia que estava acontecendo e eu estava aqui sem saber o que fazer. Acho que eu não tinha muito que fazer. Eu era um inútil.

Noah veio até mim e me abraçou, se debulhando em lágrimas também. Mas depois deste breve e forte abraço, ela me olhou nos olhos. “Jasper, a gente precisa fazer alguma coisa. Não se preocupe, não entre em desespero! Isso só iria atrapalhar ainda mais!”

E o que ela quer que eu faça? Como ela quer que eu esteja se meu irmão corre um altíssimo risco de vida? Calmo? Tranquilo? É lógico que deste modo eu não estou. Parte de mim estava com ele lá no fundo, lá no sombrio e úmido fundo do poço.

Quando as pessoas diziam que estavam no fundo do poço, se referindo à falta de dinheiro, elas, com certeza, não sabiam o real significado de se estar realmente lá. O desespero em mim apenas crescia, não parava mais!

Então saí correndo porta afora, em busca de meu pai novamente. O encontrei agachado na beira do poço, conversando com Bryan. Me ajoelhei junto de papai, ao seu lado.

“Bryan, e como se sente agora? Tudo bem?” Havia menos pânico em sua voz do que aparentemente ele estava.

“Estou bem papai, apenas as minhas pernas que estão frias demais. Estou me sentindo fraco...” sua voz distante disse.

“Não se renda Bryan! Lute! Lute por você, meu filho! Por sua vida, por mim, por sua mãe, por seu irmão, por nós!” papai disse, desesperado com o novo relatório do que Bryan estava sentindo ali no fundo.

“Brrry-an?” minha voz saiu tremida, banhada em pânico.

“Sim, Jasper...”

“Vo-vo-voo-cê está-tá bem?” – eu estava com medo, muito medo, e estava gaguejando também.

“Estou, Jasper. Estou bem. Não se preocupe!” – sim, esse era o meu irmão Bryan. Mesmo em perigo, numa gigantesca e horrenda enrascada, ainda pensando no melhor para mim.

“Por favor” agora eu havia recomeçado a chorar, “por favor, seja forte! Muito forte! Nade bastante! Por favooor!” E caí sentado no chão chorando, com os joelhos dobrados, meus braços por cima deles... eu não estava suportando a ideia de ter meu irmão ali embaixo sozinho. Bryan nunca me deixou sozinho, eu tinha de estar com ele – aqui em cima, pelo menos!

Apesar de todas as nossas diferenças, no entanto, ele sempre me protegeu como todo irmão mais velho faria. Agora era a minha vez de tomar a atitude de um irmão mais velho. Eu tinha de fazer isso.

“Acalme-se Jasper, está tudo... tudo bem.” Bryan começou a dizer, mas se interrompeu dando uma leve gemida após o ‘tudo’, o que fez com que papai parasse de se preocupar com o filho mais novo – eu nem tinha percebido que papai estava com as mãos em meus ombros.

“Bryan, o que foi?” papai perguntou se inclinando para dentro do poço, com as mãos se apoiando na borda.

“Nada. Acontece que minhas pernas estão congelando, aqui está muito frio... e molhado.”

Isso não era justo! Meu irmão! Meu único irmão, que eu tanto adorava, estava lá no fundo passando por dificuldades que eu nunca desejaria a ninguém. Eu só tenho um irmão! Por que nenhuma das crianças escravas que tem mais de um irmão não caiu aqui? Por que justo comigo?

E ainda em pânico, ouvi os passos de alguém correndo em nossa direção. Era Noah que vinha com Julia, outra empregada que trabalhava na cozinha, e o Merryl. Eles traziam outras cordas de várias cores. Ali, ao redor da borda do poço, os três começaram a amarrar um pedaço de corda no outro.

Como as cordas eram grossas, todos tiveram trabalho para amarrar. Em poucos minutos, tínhamos uma extensa corda cheia de nós. Papai instantaneamente a pegou e a jogo para Bryan, o avisando sobre a mesma.

“Bryan, já estamos te tirando daí filho. Se segure! Não solte!”

Ouvi a corda encontrar com a água no fundo do poço, e então vi a corda dar uma puxadinha. Era Bryan que havia conseguido se segurar. Assim que papai se certificou de que Bryan estava segurando a corda, ele se levantou e começou a puxar. Merryl, Noah e Julia formaram uma fila atrás de papai, cada um segurando um pouco da corda que estavam puxando Bryan.

Parei de chorar, e tentei levantar. Não consegui. Papai percebeu e me disse para ficar onde estava, pois eu poderia cair também no poço.

Em poucos minutos, percebi que Bryan estava voltando, chegando à tona. Como eu estava sentado, fiquei de joelhos – mais ou menos a altura da beira do poço –, e segurei o braço, e depois as roupas de Bryan, assim que ele surgiu. Ajudei ele a voltar. Ele caiu no chão rolando, exausto.

Papai largou a corda e correu para abraçá-lo. Eu não tive outra reação: apenas o abracei também. Papai estava chorando, eu estava chorando de novo, e Bryan estava apenas cansado, com pouca força para abraçar-nos de volta em resposta.

Papai o segurou pelas costas e pernas, e o levantou. E começou a andar rumo à nossa casa – Julia e Merryl em sua cola. Noah veio até mim ao chão, e me abraçou novamente. Nós dois estávamos chorando agora num choro ritmado, em conjunto, em dupla.

“Está tudo bem agora, pequeno Jasper. Agora está tudo bem. Vamos entrar também” Noah me disse. Como minha perna ainda estava em anestesia, ela passou suas mãos em minhas costas e pernas, e então me senti leve como uma pequena ave. Descansei minha cabeça em seu ombro – ainda soluçando por conta do choro. Não vi mais nada, eu estava cansado demais com o pânico se dissipando de mim. Tudo isso me havia sido muito custoso.

5 comentários:

Lia Brito disse...

Amei, Jasper criança é uma graça!!!

Lucas disse...

Essa fiic é muito legaal ! :D

Rainbow disse...

vou comentar em tudo apartir de agora...
AMOOOOOOOOO Jasper!!!!

Marcela disse...

Meu Deus!!! Eu quase morri do coração!
Esou amando a fic! Amo Alisper!

Marcela disse...

*estou

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