Solitário - Capítulo 31: O Dom De Maria

“Senhoras” disse em som alto o suficiente para que elas escutassem – para um humano, não passaria de um sussurro, “temos Elliott Odoms, um Major, Carl Darwin e Lloyd Bacon. Todos soldados, do jeito que você queria Maria... Mandei eles se limparem no riacho por causa do banho de sangue que as roupas deles tomaram.”

Elas me olharam e sorriram em resposta.

“Bem, então isso quer dizer que já temos o suficiente para a tomada de Monterrey?” Nettie me perguntou esbanjando felicidade – assim como as outras duas, Maria e Lucy.

“Olhe, precisamos treiná-los antes, mas eu mesmo me encarrego disto. Assim que eles estiverem prontos eu avisarei a todas.”

“Quando começarão os treinamentos?” Lucy perguntou.

“Posso começar hoje mesmo. Eles estão totalmente descansados e alimentados até o último fio de cabelo. É possível de se ver o quão fortes eles são... Até me arrisco a dizer que eles estão prontos para começar logo após o banho e a troca de roupas.”

“Precisa de companhia? Ajuda? Alguma coisa?” Maria me perguntou. Sorri maliciosamente para ela.

“Gostaria que não tivesse perguntado, não temos tempo para isso por hora...”

“Hey, vocês dois... quando quiserem essas coisas, façam um favorzinho para nós antes: saiam de perto, ok!?” Nettie disse enrugando o nariz, como se sentisse nojo de um humano doente com remédios correndo por suas veias.

“Sair de perto? Ah, por favor Nettie, desse jeito até parece que você é a santa do grupo...” Maria respondeu brincando.

Nettie fez uma careta, enquanto eu e Lucy ríamos incansavelmente.

“É só que... bem, essas coisas são só de vocês dois... Eu nunca fiz essas coisas na frente de você, Maria!” Nettie tentou argumentar, mas todos sabiam que ela estava lutando por uma batalha já derrotada.

“E quem disse que estou fazendo essas coisas? Só estamos conversando...”

“Isso, então... Eu nunca falei...” Nettie cortou Maria.

“Nãaao, coitada! Nunca falou...” Lucy começou sarcástica, interrompendo Nettie, “nunca falou... ela apenas descrevia os fatos caso interessasse a nós duas informações de anatomia e reprodução sexual!”

Não houve quem aguentou e todos caímos na gargalhada, quer fosse bem fugir de assuntos importantes ou não.

“Voltando ao assunto” Maria retomou após uma leve pausa para respirarmos, “você precisa de ajuda com os novatos?”

“Não, obrigado. Estarei bem com eles, serei breve com as demais informações e os ensinarei a combater. Aliás, irei agora mesmo atrás daqueles...”

Dei um beijinho na testa de Maria, o que fez com que Nettie e Lucy olhassem desconfiadas, provavelmente para ver se toda a discussão sobre biologia começaria novamente. Decidi provocar.

“Que foi? Querem beijinhos também?”

“Não” as duas responderam em coro, o que nos fez rir.

Andei rumo ao pequeno riacho ali perto ainda rindo – Deus, não é que elas estavam se entendendo mesmo? Quem diria...

Os encontrei nadando sem as camisetas ou blazers das fardas – benção por eles estarem apenas sem as camisetas, se estivessem sem o resto também, eu me amaldiçoaria por meus olhos vampíricos enxergarem excelentemente bem neste breu da noite.

“Hey, novatos, venham até aqui”.

Mas mesmo eles vindo até mim lentamente, eu fui até eles perto do riacho. Sentei em um tronco ao chão que estava começando a secar, provavelmente arrancado por um vampiro – ninguém mais conseguiria arrancar um tronco desta grossura e peso e deixá-lo à beira de um riacho enquanto não há mais nenhum tronco arrancado ou buracos na terra por perto. Sim, foi um vampiro. Cheira a vampiro. Maldito...

“Eu irei ensiná-los a lutar do nosso modo de vampiro. Sei que sabem lutar como soldados, mas agora será necessário algo além de vocês.” Me levantei, eu não queria ficar falando em linha de visão mais baixa que os novatos – eu estava sentado e eles de pé –, eu era o Major daqui, por assim se dizer... “Suas armas estão consigo mesmos: braços fortes, pernas rápidas, cabeça e mandíbula. Vamos...” disse fazendo sinal para que me acompanhassem.

Corri o máximo que pude, eu não queria ser deixado para trás pelos novatos. Seria horrível. Que vergonha... Rapidamente eles me alcançaram, já com as camisetas vestidas – os blazers continuaram no chão, e eu teria de dar um jeito, seja limpando e usando elas ou escondendo elas. Sem sangue à vista, sem provas, sem vítimas. Lembram?

Chegamos a uma clareira com a vegetação mais espessa e baixa que eu já havia pisado em minha vida – nem parecia que estávamos no Texas ainda, mesmo que na divisa com Novo México. Parei ao centro, e então comecei as instruções.

“Somos em quatro, portanto ficaremos em duplas para os combates agora por início.” Elliot ficou comigo, enquanto Carl e Lloyd ficaram como par. “Há muito o que se saber sobre batalhar e os vampiros, mas aos poucos irei contando aos poucos.”


[Maria]

Elliott Odoms, Carl Darwin e Lloyd Bacon. Os nomes dos meus novos soldadinhos. Quanto mais, melhor. Será mais difícil, é claro, de manter em sigilo tantos vampiros e em paralelo conquistar as cidades.

Monterrey, minha antiga cidade será minha novamente. Deixei com que este sentimento de luxúria e raiva crescesse em mim furtivamente. Jasper não estava por perto, portanto eu poderia sentir o que eu quisesse sem ser manipulada.

Sinto como se ele me manipulasse a cada minuto, mesmo sabendo que é para o meu bem, não me sinto confortável com isso. Mas o sem vergonha me faz sentir confortável, mesmo que eu não esteja.

Ok, confesso, adoro. Amo.

Este sim, o soldado que não me escapa, mesmo que eu odeie cada segundo ao ser manipulada.

Já não estava mais com Net e Lu, pois estavam agora fazendo tranças e amarrando das mais diferentes formas os cabelos uma da outra. Pensando nelas, agora penso que estamos nos dando tão bem. Será que é o Jasper, de novo?

Não sei, mas se ele sabe me manipular pelas emoções, eu o sei fazer por outros motivos. Prefiro deixar em oculto este motivo, mas não é difícil de adivinhar.

Éramos vinte e três vampiros agora, uns mais fortes, outros pouco mais fracos. Éramos muito mais do que poderíamos ser. Se os Volturi se intrometessem novamente... Dios, eu estaria perdida. Da última vez vi o que foi feito e estou rezando para que isso não aconteça novamente.

Eu não quero ficar em pedacinhos.

Não quero que Jasper fique em pedacinhos.

Não quero que ninguém de meu bando fique assim em pedacinhos – pelo menos enquanto eles me prestarem eu não quero eles com uma parte em cada lado. Quero eles todos juntos, inteiros por enquanto.

Corri até onde Jasper estava com os três novatos, e de olhar, percebi o magnífico trabalho de Jasper em me trazer estes soldados. Eles eram fortes e inteligentes. E sem saber, me trouxe os três com dons. Eu tinha este dom: de ver o dom nos outros, que pode ser inútil de vez em quando... pelo menos quando você não está lutando ou arregimentando soldados para lutar, é inútil.

“Elliott, quando for contra-atacar, faça desta forma. Segure por baixo do braço e o torça com força para que o braço seja arrancado.”

Este era o Jasper, sempre confiante, corajoso. Deus, que homem... Vampiro... que seja!

Elliot, o que estava com Jasper tinha o poder de velocidade. Ele era tão veloz que eu mal podia vê-lo quando corria. Pude perceber que Jasper estava tendo problemas com ele, mesmo sabendo que nestas horas ele estaria usando seus poderes de manipulação sob todos.

“Depois, o inimigo ou baterá em recuo ou cairá sentindo dor. Se cair, vá para o outro lado e arranque o outro membro e a cabeça. Assim já é o suficiente para que ele fique e morra.”

Conforme Jasper foi falando, foi demonstrando com Elliot que ficava ajoelhado.

“E não se esqueçam de juntar os corpos depois e tacar fogo.”

Ah sim, fogo era importante.

“Mas... eu tenho medo de fogo!” um deles disse.

“Carl, só com fogo acabamos de vez com nossa espécie. O fogo é o único capaz de nos derrotar de vez...”

Carl tinha medo de fogo. É… é bom ter medo de fogo já que é um vampiro! Mas mesmo tendo medo do fogo, pude ver que a pele de Carl era diferente das demais. Era… não sei, mas grossa, rígida... Seria esse seu dom? Bem, era útil... Pelo menos ele tinha motivos agora para não temer o fogo se estiver inteiro...

“Não se passe de criança!” um começou a se irritar, mas Jasper o interrompeu.

“Lloyd, acalme-se! Eu já disse a todos vocês, não briguem, pois se brigarem, vocês vão conhecer o fogo de mais perto do que acham que podem chegar!”

Este era o meu Jasper: o corajoso e sábio. Sem mais medo algum, percebi que todos relaxaram com as palavras de Jasper – seu dom, com certeza. Ele ficará muito cansado depois de tudo isso que está passando, ah disso tenho certeza.

E tinha Lloyd, que me fez perceber que podia ver melhor ainda que os outros. Não sei, mas ele parecia apenas olhar como se visse muito mais. Para falar a verdade, sei que ele tem algum tipo de dom com relação na visão, mas não sei qual.

Eles continuaram a treinar e batalhar até o amanhecer, ou quando os quatro já começavam a brilhar feito estátuas de mármores o suficiente para se dizer que o dia estava começando.

Jasper estava exausto. Ok, isso não é coisa que se vê todo dia. Provavelmente, esta assim por não só treinar fisicamente como os controlar emocionalmente. Isso acabaria com ele em uma semana se continuar nesse ritmo.

Me aproximei deles, pus a mão no ombro direito de Jasper, o que o fez girar para me encarar. De súbito, sua expressão cansada se encheu de alegria.

“Jasper, por hoje chega. Descanse, eu cuidarei deles…” e olhei para eles, que estavam se sentando para descansar.

“Você vai cuidar deles? Tem certeza? Me dê apenas um minuto, será o suficiente para recarregar as energias...”

“Não querido, descanse. Aliás, todos vocês” falei para os três ao chão, “vamos de volta ao nosso cantinho perto do riacho e da estrada. Todos irão descansar por hora e depois do meio-dia retornaremos o treinamento. Eu mesma irei ensina-los...” – eles se entreolharam, mas foi Jasper quem começou a explicar.

“Sim, esta é a Maria, a líder do bando. Vocês devem seguir as ordens dela, seja lá qual for a ordem... Ela esta acima de tudo e todos, entenderam?” Jasper disse todo orgulhoso – ah este homem, meu Deus, está me deixando louca falando deste jeito de mim...

Todos me cumprimentaram e vieram me saudar beijando-me a mão. Olhei para todos de perto e percebi o quão certa eu estava sobre a habilidade de cada um.

“Obrigada Jasper, querido” lhe disse olhando amorosamente, mas me virei para os outros. “Vocês tem dons que me serão úteis, fez um ótimo trabalho, querido Jasper.” Olhando para cada um da cabeça aos pés, fui dando meu veredicto a respeito deles. “Elliot, você é muito mais rápido que a maioria dos vampiros, o que me faz pensar que é seu dom. Lloyd, você tem algo diferente na região dos olhos. Consegue ver as coisas bem? A que distância consegue enxergar? O que vê?”

“Bem” ele começou tímido após uma reverência, “eu vejo tudo. Desde a mais minúscula das formigas até as casas que ficam atrás daquelas árvores lá atrás.”

Todos seguimos com os olhos para o horizonte exatamente onde ele estava apontando com a mão o que ele dizia ter as árvores. Fiquei boquiaberta. Sim, eu estava certa! Sorri em resposta.

“Isto me deixa muito feliz, caro Lloyd!”

“A senhorita se importa em me explicar o motivo? Só eu enxergo assim?”

“Sim, somente você enxerga tão bem assim. Nos vampiros temos poderes extras, mas este seu é o seu dom. Você enxerga além dos objetos físicos. Você me será extremamente útil para encontrar os inimigos, e poderá trabalhar junto de Billy, nosso rastreador!”

Voltei minha atenção para Carl totalmente satisfeita com os novos integrantes. “E você querido Carl, não se intimide com o fogo” – se fosse capaz, ele ficaria totalmente vermelho de vergonha –, “você é um vampiro, seria um tolo se não tivesse medo de fogo.” Com isso, percebi Jasper abafar uma risada. “Mas não se preocupe, o toque de sua pele é… leve... mas meus olhos não me enganam, meu dom não me engana. Você é completamente imune ao fogo. Isso, lógico que quando estiver inteiro, com os membros ainda no corpo ou então ainda forte. Não há com o que se preocupar. Os que tentarão te desmembrar sim terão com o que se preocupar!” disse rindo.

Todos rindo instantaneamente, olhei para Jasper para ver se era ele, mas percebi que não era. Retomei.

“Pensando bem, todos irão para os cuidados de Nettie e Lucy, as outras duas líderes do grupo. E você Jasper” disse o encarando carinhosamente, “você ficará sob meus cuidados especiais.”

Tanto eu quanto ele sorrimos malevolamente, provavelmente, com o roteiro dos cuidados passando não só pela minha cabeça, quanto a dele.


[Jasper]

Voltamos para perto do riacho e fiquei sob os cuidados de minha querida Maria. Após um longo descanso, nos reunimos novamente. Agora, todos os vinte e três vampiros estavam juntos – não literalmente, uns estavam mais distantes dos outros, outros se abraçando. Como a Lucy com o Daniel, o loirinho que aparentava ter uns quinze anos e que conseguia flutuar e fazer alguns objetos flutuarem também – era o nosso aprendiz de mágico e de bruxaria.

Nunca vi tantos vampiros juntos em só lugar em toda a minha vida. Posso dizer que não me senti incomodado nem com a quantidade deles e muito menos com o que cada um sentia, mas também posso dizer que se qualquer coisa preenchida por sangue passasse, ele seria uma coisa realmente azarada! Estupidamente azarada! Incrivelmente azarada!

Quase valia a pena conhecer alguém assim! Quase!

Maria, Nettie e Lucy estavam no extremo dos vampiros ao Sul, a Lua que ainda subia já fazia com que a leve claridade emergindo dançasse sob seus delicados fios de cabelos.

Maria tomou a iniciativa.

“Meus caros soldados, amigos vampiros, é esta a noite em que tomaremos Monterrey das mãos de seja lá quem estiver por lá. Aquela cidade é minha, e de mais ninguém.” Luxúria, poder, ela sentia tantas coisas que eu soube que poderia haver coisas que eu nem conhecia. “Vocês, como me ajudarão a tomá-la das mãos dos outros, também terão poder sobre a cidade. Vocês poderão se alimentar quantas vezes quiserem, desde que seja da forma que sempre os ensinei. Vocês reinarão nas ruas, nos becos, nos estabelecimentos. A cidade será de vocês também, mas acima de tudo, será minha.” Luxúria, com certeza a luxúria mais cega e confiante que já senti na vida.

Ela olhou cada um nos olhos, talvez tentando transmitir coragem – o que era ridículo, quem manipulava emoções aqui era eu!

“Agora vamos!”

Ela deu as costas a todo o bando e, Lucy de seu lado esquerdo e Nettie no direito, ela dispararam em direção ao Sul a toda velocidade. Logo após elas saírem, fiz sinal para que os demais as acompanhassem e então fui ao encalço delas.

Monterrey, México, em breve haverá algo em que muitos habitantes e suas famílias desejarão esquecer!

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