Solitário - Capítulo 38: Ciúmes

Lucy foi caminhar na montanha toda contente. Nettie foi para cima da casa, no telhado, observar como a cidade era monótona cheia de melancolia. Marcos continuou sentado e encostado na parede da janela sem ter nada o que fazer. Lloyd ficou em pé mesmo olhando para o que acontecia pela janela. Javier ficou encostado em um canto da parede me encarando.

Esse vampiro tinha problemas... e eu não estava gostando nem um pouco do que seus sentimentos estavam me entregando como relatório de seus planos.

“Algum problema, Javier?” eu quis saber.

“Não, claro que não!” ele tentou se esquivar.

“Jura que não?”

“Juro, claro!”

“Certeza?”

“Sim, totalmente!”

“Engraçado” mudei meu tom de voz para um zombeteiro, “seus sentimentos não me dizem isso! E seus sentimentos não mentem para mim!”

“Não tenho nada, não, Jasper! Claro que não!”

“A sua sorte é que você vai para outra cidade bem longe daqui. Se continuasse por aqui, pela região, tenho certeza que não duraria mais que dois minutos!” o ameacei. “E que fique avisado. Tome cuidado com o que sente!”

“Ok” ele disse assustado.

E só para esclarecer: ele estava sentindo um misto de ganância, como todos por aqui, felicidade e maldade. Tudo junto. E isso não era bom sinal. Minha convivência com vampiros em guerra me ensinou que, essa combinação, geralmente resulta em traição. E se ele estava me encarando tanto, pode apostar que ele está pensando em colocar Maria em meio aos seus pensamentos sujos!

...

Três dias se passaram e então os novatos acordaram famintos. Por sorte, escutei que seus corações estavam parando de bater, e então pedi ajuda a Gabriel, um dos nossos que não tinha dom algum – quase inútil –, para caçar alguns humanos para eles se alimentarem.

Conseguimos reunir onze corpos. Corremos de volta para a casa. Hmmm... sangue fresquinho!

Ficamos sentados, eu e Maria, esperando que os dorminhocos acordassem para que pudéssemos lhes explicar tudo, detalhe por tudo.

Finalmente, após algumas horas de espera – e muita paciência por minha parte – eles acordaram. O sangue nem estava mais tão fresco assim, mas eles não iam saber diferenciar. Não, pelo menos, na primeira vez.

O primeiro se levantou. Olhou para tudo a sua volta, até que deu de cara conosco sentado em um canto. O segundo e o terceiro acordaram quase, que, ao mesmo tempo. Minutos após, o último se levantou. Nenhum deles fez sequer um movimento.

Estavam confusos. Não sabiam onde estavam, o motivo ou como chegaram ali. Não nos conheciam. Não sabiam o que eram – e esta era a pior da parte em que eu e Maria tínhamos de avisar-lhes.

Maria foi à direção em que estavam.

“Qual o nome de vocês queridos?” ela perguntou gentilmente.

Eles se entreolharam.

“Meu nome é Francisco” o primeiro respondeu.

“E eu sou Jorge” o segundo respondeu.

“Miguel” e “Pedro” o terceiro e o quarto responderam rapidamente.

“Ótimo, queridos. Me chamo Maria, e este é Jasper” ela disse apontando para mim, que continuava encostado na parede.

“Maria, eles estão com sede!” lhe disse antes que ela começasse o ‘blá blá blá’.

“Bem, então não fiquem envergonhados. Sintam-se à vontade!” ela disse apontando para os corpos caídos ao chão. Eles se levantaram ainda confusos, mas a sede era muito maior.

Rapidamente, os corpos estavam no chão totalmente drenados. Foi o suficiente para acalmá-los, por enquanto.

“Ok, agora sentem e apenas escutem!” lhe ordenei, ainda do meu cantinho.

“Obrigada, Jasper!” Maria me agradeceu. “Bem, então, como eu estava lhes dizendo, meu nome é Maria e ele é o Jasper. Somos em várias pessoas aqui, tem ainda Nettie e Lucy, apesar de que elas vão...”

“Maria?” a interrompi.

“Sim.”

“Acho que eles não se interessam pela Nettie ou pela Lucy.”

“Não entendi!”

Levantei-me, fui até ao lado de Maria, bem a frente dos quatro que estavam sentados.

“Somos todos vampiros, e o sangue é o alimento de vocês. E como todos sabem, sangue só se consegue do corpo de alguém vivo! Portanto, eles” falei apontando para os corpos, “eles serão os seus alimentos. Mas, só há um problema: não podemos ser vistos ou reconhecidos. Ninguém pode saber quem somos, caso contrário, outros vampiros entrarão na briga e então estaremos perdidos. Mais alguma pergunta?”

“Err...” Francisco começou, “eu não sabia que vampiros existiam!”

“Existem, mas não podemos deixar com que as pessoas saibam. Quando isso chegou a acontecer tempo atrás, esses vampiros que lhes falei interromperam os planos e acabaram com os envolvidos” lhes expliquei – Maria tinha perdido o jeito de lhes explicar tudo.

“Quem são esses? Esses vampiros que acabaram com os outros?” Pedro perguntou.

“São os Volturi. Mais alguma pergunta?”

“Somos vampiros mesmo?” Jorge perguntou.

“Sim, e Maria tem muito a explicar a vocês!” disse após olhar para Maria, que não gostou nem um pouco de eu deixá-la com todo o trabalho. “Ela é vampira há muito mais tempo que qualquer um daqui. Ela conhece tudo e vai passar tudo para vocês. Se tiverem alguma dúvida das coisas, há um vampiro de cabelos escuros aqui nesta casa chamado Lloyd. É só chamá-lo que ele os ajudará até que parta!”

“Ela... quer dizer, Maria disse que eles estão de partida. Para onde vão?” Miguel perguntou extremamente confuso e curioso.

“Estamos em guerra com outros vampiros, e Maria tem uma extensa faixa de terra. Temos de proteger nossas propriedades, por isso estamos mandando quem confiamos para proteger ou, pelo menos, avisar se algo estranho estiver acontecendo. E, por causa disso, precisamos de mais pessoas aqui para nos ajudar com a luta.”

“Por isso nos fez assim?” Miguel quis saber.

“Sim, e não fiz assim, os transformei. Agora Maria cuidará de vocês!” disse já indo para a porta.

“Aonde vai?” Maria me perguntou. Ela estava assustada.

“Não se preocupe” disse comandando as emoções daquela sala para que todos ficassem bem ali, “voltarei logo!”

Saí correndo. Não queria saber para onde, só sai correndo. Deixei que minhas pernas me levassem para onde meu coração queria que eu estivesse. Talvez, onde minha mente me mandava estar.

Certo, fui para onde ninguém estava. Saí de Monterrey e cheguei ao topo de uma montanha. De lá, eu podia ver tudo. Via Monterrey e mais duas cidades muito próximas.

Fiquei olhando o dia passar a minha frente. Fiquei observando como o Sol dançava no céu e depois, cansado, se punha abrindo espaço para que a Lua viesse ter a sua vez na dança.

Não me preocupei com o que poderia estar acontecendo lá na cidade. Não me preocupei com o brilho que minha pele irradiava quando os raios solares me tocavam. Esqueci de tudo. Ou, pelo menos, tentei.

Ao anoitecer, voltei para a nossa casa. Nettie e Lucy estavam quase de partida, junto de Javier, Marcos e Lloyd.

“Jasper, pensei que você ia fazer com que me atrasasse para a viagem!” Lucy me recebeu após dar-me um apertado abraçado. Ela não queria ir, estava com medo, mas... ao mesmo tempo, ela estava feliz por deixar para trás Maria. Elas duas não estavam se entendendo muito bem mesmo!

Aliás, nenhuma das três estava se entendendo muito bem ultimamente!

“Desculpe-me!” – foi só o que pude dizer.

Nettie veio até mim também, e me abraçou. Ok, por esta eu não esperava! Mas ela era insignificante. Veio com os mesmo sentimentos de ciúmes e ganância. Se ela não fosse embora, provavelmente, estaria planejando algum plano contra Maria.

“Adeus, Jasper. Boa sorte!” ela disse rispidamente.

“Obrigado, para você também!” lhe respondi no mesmo tom. Ela se virou, e então partiu.

“Ora, não ligue Jasper! Você a conhece, não?!” Lucy tentou me consolar de alguma coisa que não existia.

“Ahn? Você sabe que não precisa falar desse modo comigo, não? É uma ofensa agir desse jeito comigo. Eu acho que sei como me virar com sentimentos!” brinquei.

Todos riram.

“Então adeus, Jasper. Boa sorte!”

“Igualmente, Lucy. Seja cuidadosa!”

“Sim, eu sei. Maria já me disse milhões de vezes isso!” ela respondeu sem paciência.

Marcos, Javier e Lloyd então me cumprimentaram sem uma palavra. Não era necessário. Eles estavam orgulhosos ao me cumprimentar. Estavam felizes por terem feito algo de útil por nós.

“Obrigado a todos!” falei antes que fossem.

“De nada!” – esse era o Lloyd, sério e brincalhão ao mesmo tempo. Como isso podia ser possível?

Pensando bem, eu queria que essa pergunta não tivesse resposta. Havia tantas outras que eu queria resposta. Esta não era importante!

Todos se foram. Ficamos Maria, os novatos e mais alguns já adquiridos anteriormente.

“E então? Já passou tudo para eles?” questionei Maria, que, apesar de se sentir parte chateada com a partida das amigas, também estava se sentindo mais leve, mais feliz. Se alguém entende as mulheres, por favor, venha falar comigo!

“Sim, mas o treinamento nós dividiremos!”

“Ok” afirmei e então entrei na casa. Os quatro já estavam lá dentro, e estavam curiosos para saber mais.

Sentei no meu cantinho da parede. Maria veio também.

“Você sente?” ela me perguntou ansiosa.

“Os sentimentos deles, sim. E o seu também. Mas isso não é novidade para você. Por que perguntou?”

“Ah, desculpa. Eu estava me referindo aos seus dons!”

“Você sabe que eu não sinto isso!”

“Bem, então vou lhe passar as novidades. Francisco consegue manipular os pensamentos das pessoas. Ele não lê, mas consegue fazer com que as pessoas tragam à tona tudo aquilo que sempre quis esquecer. Ele já testou comigo e com os outros. É excitante!”

“Excitante? Você tem problemas, não, Maria?!”

“Por quê? Qual o problema disso?”

“Não é excitante fazer com que as pessoas se lembrem de tudo o que esqueceu.”

“Bem, então diga por si mesmo. E ele é muito útil para nós!”

“Francisco, nem experimente se engraçar comigo! Se assim fizer, você se arrependerá! Não acredite que você é insubstituível, por que você é!”

Ele ficou pasmo com as palavras. Talvez eu estivesse manipulando demais suas emoções de uma forma negativa.

“Jasper consegue manipular as emoções. Vocês formam uma dupla formidável, não?!” Maria tentou nos animar.

“Não, nem comece, Maria!” – ok, eu estava de mau humor por causa de Francisco. Se ele me fizer lembrar meu passado, eu acabo com a raça dele! Deixei isso bem claro com minha expressão.

“Mas qual o problema, Jasper? Não estou entendendo!”

“E é melhor que continue sem entender!”

“Por que você não quer falar sobre isso?”

“Por que você não continua me falando sobre eles em vez de eu ter de falar sobre mim mesmo? Isto aqui não é uma seção de terapia psicológica!” – manipular as emoções às vezes me faz tão bem...

“Ok” ela respondeu animada. “Jorge consegue encontrar as pessoas dentro de um limite.”

“Então é um rastreador!”

“Mas rastreador usa o cheiro do sangue. Ele usa de qualquer coisa que tenha pertencido a pessoa. Qualquer objeto!”

“Nossa, que utilidade! Nós vamos, com certeza, querer nos encontrar com nossos inimigos o quanto antes!”

“Não seja sarcástico, Jasper!”

“Hey, você consegue ao menos encontrar a pessoa antes de ver ela?” perguntei ao rapaz.

“Não, pelo menos, acho que não ainda!” Jorge respondeu.

“Quanta utilidade, Maria!” lhe respondi – meu mau humor estava crescendo sem limite hoje.

“Ok, Jasper” ela disse começando a ficar zangada, “Miguel consegue amenizar a situação. Acalmar sabe?!”

“Nooossa, esse sim é útil!”

“Jasper, quer me fazer o favor de deixar esse seu sarcasmo de lado? Quem os trouxe aqui foi você!”

“Quem me pediu para trazê-los foi você. Quem vê os dons é você. Quem disse que eles tinham bons quando os viu foi você” – eu estava chegando ao ápice do mau humor.

“Ok, esquece! Vamos continuar. E tem o Pedro, que consegue guardar tudo o que já lhe foi dito. Tudo!”

“Nossa, esse então...” eu estava explodindo de sarcasmo. Meu humor estava lá embaixo, no mais profundo poço. Mas Maria me interrompeu. Droga! Só por que eu iria fazer a melhor das minhas metáforas.

“Chega, Jasper. Qual é o seu problema? Me diz!” – agora sim Maria estava brava. Fui controlar suas emoções. “E não me manipule!” Ok, sem controle de emoções.

“Estou cansado. Só isso!”

Levantei-me e saí correndo de novo. O que estava acontecendo comigo? Será que o que eu queria era ter ido como os outros para outro lugar? Será que o que eu queria era ser livre e fazer o que eu bem entendesse? Por mais que uma cidade estivesse em minha responsabilidade?

Creio que estou com ciúmes.

Corri ainda mais tentando fazer com que esse sentimento ridículo ficasse para trás. Eu não queria sentir isso de novo, mas era tão... tão... meu. Como eu poderia me desfazer de algo que me faz parte?

Quem sabe, se eu ficar um tempo fora, eu esqueça tudo o que aconteceu recentemente. Quem sabe, se ao voltar, não sinta mais ciúmes. Quem sabe...

1 comentários:

Paula disse...

nao entendi porque o Jasper teve ciumes... achei que ate este momento da fic, ele estava satisfeito de estar com Maria e ser seu preferido...

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