Solitário - Capítulo 39: Juarez

Duas semanas depois – 1862

Mantemos contato com os vampiros que designamos ficar com cada cidade. Nada havia acontecido – pelo menos nada há três dias. Não conseguimos conversar com Nettie, muito menos com Lucy.

Mandamos dois dos nossos vampiros veteranos, um deles era rastreador, eles chegaram, procuraram Nettie, e nada! Pois então foram procurar Lucy. O mesmo! Nada!

O pior de tudo foi contar à Maria aquilo. Eles estavam tremendo de medo, se é que isso é capaz em um vampiro! Maria estava furiosa. Gritou para os que pudessem ouvir que aquilo foi traição, que elas entregaram a cidade, que nunca tinha confiado mesmo nelas... Essas coisas!

E nem disse nada para não amargá-la ainda mais, afinal, quem tinha determinado que Nettie e Lucy fossem para outras cidades tinha sido ela mesma. Ela mesma tinha dito que só iria mandar quem confiava. Agora ela fica dizendo que sempre soube que elas não eram confiáveis?

Nem manipular eu tentei. Só fiquei longe. Esta era a minha melhor estratégia, por hora.

Ok, eu tenho sérios problemas com mulheres! Já me conformei!

O problema é que Maria estava ficando cada vez mais histérica a cada minuto que se passava. E eu? O que eu poderia fazer? Hmm... sair de perto, é óbvio...

Dei uma volta pela cidade a fim de encontrar algo que pudesse me distrair. Não encontrei nada! Fui para a montanha, lá no topo dela, para admirar a beleza da cidade de cima, mas então ouvi alguém correndo em minha direção.

Alguém correndo rápido. Muito, muito rápido. Além da velocidade humana. Um vampiro!

Olhei para ver quem era, e dei de cara com Lloyd a poucos quilômetros de mim – ele já tinha me visto. Acenar para ele seria besteira...

Ele chegou e sentou-se ao meu lado na ponta da montanha, como se hiperventilasse – se é que isso é capaz em um vampiro... Ainda tenho minhas dúvidas sobre certas coisas em vampiros...

“Então, por que vens correndo assim? Qual o problema? Por que está tão ansioso e com raiva?” lhe perguntei.

“Eu... eu não pude... Maria vai acabar comigo...” ele tentou dizer.

“Calma, respire primeiro” lhe disse já manipulando – o que nem era preciso dizer –, “o que aconteceu?”

“Eu estava me alimentando esses dias, e então sem querer, deixei que em um deles restasse um pouco de sangue...”

“Como é que é?” o interrompi. Raiva tomando conta de mim.

“Não fique bravo, por favor! Preciso de sua ajuda!”

“Ok” disse suspirando.

“Então, e depois esta moça acordou hoje pela manhã e lhe ensinei tudo sobre guerra e nós...”

“Moça?”

“Sim” ele disse acanhado, “moça. Mas era uma linda moça!”

“Era?” – comecei a me preocupar.

“Bem, continuando... Ela acordou, eu ensinei tudo e depois fui alimentar ela. Então, quando estávamos voltando para a casa que estávamos ficando por lá, encontrei um vampiro não muito forte e baixo com umas vestes negras até o chão...”

“Como é que é? Repete?” – agora sim eu estava preocupado.

“Vestes negras e longas arrastando até o chão. Mas ele não era muito forte, então eu e Silvia conseguimos o exterminar rapidamente. Não se preocupe com isso!”

“Não me preocupar? Você está louco?”

“Por que diz isto?” ele perguntou na inocência.

“Você realmente acha que os Volturi irão deixar que um de seus membros seja exterminado assim? De bom grado?” lhe perguntei, e então ele percebeu o grau de perigo que estávamos.

“Mas não acabou!”

“Como não? Tem coisa pior?”

“Bem...” ele disse envergonhado, “sim, tem. Aqueles vampiros do Sul voltaram e conquistaram a cidade. E conversando com eles rapidamente, pude saber que eles conquistaram as outras cidades de Maria!”

“Maravilha! Tudo está dando errado hoje! Mas... vamos, temos de contar à Maria tudo!”

Ele concordou com a cabeça, mas estava mais tenso de quando chegou aqui.

Chegando a nossa moradia, encontrei Maria mais uma vez prestes a ficar louca. Agora não tinha saída, ou eu a controlava, ou ela matava a todos nós de apenas uma vez!

“Maria, Lloyd e eu precisamos conversar com você sobre um assunto muito sério!”

“Eu sei, vejo pela cara de ambos. Vamos para o quarto lá em cima” ela disse cansada – eu ainda estava receoso quanto a acalmá-la, portanto deixá-la cansada era mais bem aconselhado. “Sobre o que é?” ela disse já subindo as escadas conosco em sua cola.

“Lloyd precisa falar o que houve em Midland!”

Paramos então no meio do quarto sem móveis e nos posicionamos em frente ao outro – só que eu estava do lado de Lloyd, pois para essa ele precisaria de ajuda.

“Comecem!” ela ordenou. Lloyd me olhou de canto confuso, com medo e indeciso se deveria falar mesmo ou não, mas começou.

“Eu me alimentei e transformei sem querer uma moça chamada Silvia que acordou hoje pela manhã, mas não se preocupe com ela, pois já morreu em combate hoje mesmo” ele se explicou ao ver a cara de Maria. “O que aconteceu, porém, foi que enquanto estávamos andando pela cidade, encontramos um moleque, creio eu, meio baixo com um manto bem escuro que arrastava ao chão como se fosse uma parte de seu corpo, caía como se fosse fumaça atrás de si, e era um vampiro. Tínhamos certeza daquilo. Então não pensamos duas vezes e o atacamos o vencendo. Só que então, quando acabamos de queimar os pedaços, aqueles vampiros do Sul chegaram e tomaram a cidade contra nossa vontade. Tentamos lutar, mas não conseguimos. Éramos só dois contra uns quinze, então recuei e tentei fazer com que Silvia também recuasse, mas ela não conseguiu e acabou morrendo. Então saí correndo para aqui, deixando tudo para trás, para avisá-la que suas cidades estão caindo. São muitos os que vem buscar as cidades...”

“Ok, ok, já chega sua matraca...” Maria conteve a falação sem fim de Lloyd. “Ok... estou perdida agora. O que eu devo fazer, Jasper?”

Por esta eu não esperava. “Bem, temos de continuar batalhando por nossas cidades. Se Midland foi tomada, com certeza Lucy e Nettie não deixaram as cidades porque queriam” – mentira, eu sabia que deixaram porque queriam sim!, mas Maria não precisava saber disso, precisava? – “O próximo provável alvo então, se seguirmos a lógica dos ataques será onde Javier está, em Juarez!”

“Certo, então junte os novatos que nós iremos para Juarez!” ela disse com a voz trêmula. “Você liga de ficar aqui Lloyd?”

“Claro que não, Maria!”

“Obrigada” ela disse, e saiu. Fiquei com Lloyd no quarto.

“Você fez um bom trabalho, só disse as coisas rapidamente demais.”

“Fiquei com medo que as palavras entalassem em minha garganta e não saíssem de modo algum, por isso, quando uma palavrinha saiu, fiz todas saírem juntas...”

“Sinto lhe informar, mas você é um vampiro com defeitos, Lloyd...”

“Tudo bem, disso eu já suspeitava!” ele respondeu, e ambos rimos com a situação. Até Maria voltar ao quarto.

“Encontrei Gerardo, e ele irá conosco também. Ele já foi chamar os quatro novatos. Mas... enquanto isso, Lloyd, você se lembra se aquele menino que você viu tinha que tipo de feições?”

“Sim, bem... ele me parecia bem... hmmm... não sei, talvez bem europeu.”

Maria ficou escancarada com a resposta. E eu tinha absoluta certeza de que ela pensava o mesmo que eu tinha pensado: o Lloyd acabou com um dos Volturi. Lógico, sem esquecer de acrescentar o “estamos ferrados”.

“Como assim... europeu?”

“Bem, era louro de cabelos curtos e bem finos. A sua pele também era tão mais clara quanto a nossa, e seus olhos tinha um vermelho muito forte. Deveria ter se alimentado em nossa cidade” Lloyd disse já calmo, mas Maria não estava assim. Passava longe disso...

“Ele tinha algum brasão na roupa ou colar? Algo do tipo?”

“Não me lembro de prestar atenção nestes detalhes...”

“Lloyd, pode nos dar um pouco de privacidade por um minuto?” Maria disse olhando para mim.

“Sim, claro!” ele obedeceu e saiu correndo feliz – feliz por que não era ele quem teria de enfrentar Maria agora!

“Você sabe o que isso significa, não?!” ela começou.

“Olha, podia ser um vampiro recém formado daqui mesmo. Alguém devia ter o transformado sem querer, os vampiros do Sul estão por lá mesmo... Ele foi para um lugar onde encontrou alguma roupa e se vestiu...”

“Vá ser inocente em outro lugar bem longe de mim, Jasper. Você sabe que isso significa que os Volturi o mandaram para conferir o estado da “tranquilidade” por aqui. Eles sabem que por estas regiões houveram guerras.”

“Mas isso não significa que eles vão interferir novamente!”

“Não mesmo, por que vamos acabar com estes vampiros do Sul neste fim de semana! Por isto estou com Jorge.”

“Mas ele só encontra as pessoas pelo cheiro de algum objeto!”

“E por acaso eu tenho a fita do cabelo da mulher do Ramón!”

“Como você conseguiu?” perguntei incrédulo. Ela não teve tempo o suficiente para pedir emprestado com a maior das cordialidades no último encontro.

“Bem, vamos dizer que... da última vez, gostei tanto que peguei emprestado com um pouco de força!”

“Ah sim... e esses fios de cabelos emaranhados na fita vieram parar ao por acaso também?”

“Sim, só por acaso! Vamos!” ela disse rindo, mas eu não pude rir... Como é que eu consigo aguentar essa mulher tão temperamental? Como consigo aguentar ficar perto desses seres tão estranhos e incompreensíveis? Talvez fosse mais fácil descobrir qual foi o primeiro ser a habitar a terra, seu nome, características físicas e emocionais e gostos pelas coisas...

...

Corremos nossa jornada em direção a Juarez, divisa com o Texas.

Não demoraríamos mais de dez minutos para chegar lá. Talvez os engenheiros de carroças devessem os construir de uma forma mais vampiresca. Quem sabe então, as pessoas parariam de dizer que estão atrasadas para as coisas... pelo menos, me lembro de um homem meio... digamos, roliço, me dizendo... e até que ele era amigável... só não sei quem ele era!

Mas, então me lembrei. Olhei para Francisco que estava perto de mim, quase ao meu lado.

“Se for você que está me fazendo lembrar disto, poderia ao menos me fazer então lembrar quem era aquele homem?”

Ele riu com aquilo. Era ele!

“Desculpe, mas não pude perder a oportunidade... Você quer saber quem era?”

“Sim, você pode me responder?”

“Não, mas você pode me responder...” ele disse chegando mais perto de mim.

Com Francisco ao meu lado, pude sentir que estava correndo, mas não conseguia controlar mais meus pensamentos. Um vulto de imagens percorreu meus olhos. Eu podia ver tudo, ouvir tudo o que acontecia nas imagens, que agora se mexiam...

Vi um menino de olhos castanhos e cabelos loiros olhando em um espelho turvo. Vi que o mesmo menino estava correndo em uma grande área cheia de rasteiras vegetações. Vi que o mesmo menino conversando com uma mulher negra. Vi que o mesmo menino chorando na cama. Vi o mesmo menino brincando com outro menino com pequenos bonecos. Vi o mesmo menino conversando com o homem, e o chamando de pai.

Neste instante, parei de correr. Esfreguei as pestanas com as mãos.

“Como você pôde fazer isso?”

“Ué? Mas não era isso o que você queria?”

“Mas... mas ele é... ele é...”

“Jasper, tudo bem?” Maria se preocupou comigo. Todos me olhavam estranhamente. Eu deveria estar parecendo estranho...

“É que ele é... ele é... era... não sei... meu pai... ele era meu pai... meu pai...”

“Fique calmo, querido... fique calmo, ok?” Maria me disse já me abraçando, mas eu não respondi seu abraço. Caraca, eu tinha um pai!

“Acalme-se e foque no que estamos prestes a fazer, então depois ficará livre para encontrar com seu pai, ok?”

“Mas eu não quero encontrar com ele... Ele vai achar que eu estou muito doente... ou... quem sabe morto...”

“Mas morto você já está mesmo, Jasper...” Gerardo com sua delicadeza me encorajou.

“Gerardo, por favor... Jasper está com problemas, não o incomode!”

“Ótimo, temos um vampiro com problemas mentais agora no grupo... Isso é lindo! Quem sabe não vamos informar isso a um jornal para que todos fiquem sabendo?”

“Gerardo, já chega!” Maria disse determinada. “Francisco, por favor...” ela disse apontando com o olhar a Gerardo.

Francisco foi ao lado de Gerardo, e então pude ver que ele agora estava caindo ao chão com a mão na face.

“Por favor, pare!!!” ele implorou. Mas Francisco não parou...

“Ok, Francisco. Obrigada!” – só depois disso Francisco parou – “E que isto lhe sirva como punição. Nunca mais se dirija ao Jasper do mesmo jeito que fez hoje! Nunca mais! Ele é teu superior, e você deve obediência a ele!”

“Tudo bem. Farei o que é certo de hoje em diante. Desculpe Maria. E desculpe Jasper” ele disse se levantando.

“Ok, desculpas aceitas, mas ainda assim... quem caiu de joelhos não fui eu!” lhe respondi retornando a corrida as gargalhadas. Maria estava ao meu lado, e então me deu uma cutucada com o cotovelo, mas quando olhei, percebi que ela estava segurando uma risada.

Retomamos a corrida, e então, como previsto, chegamos a Juarez rapidamente. Entramos na cidade, e o pior estava acontecendo. Uma fogueira bem alta já queimava a toda brasa.

Nos escondemos, não seria boa coisa dar a cara já de prima.

“Francisco, você pode ver desta distância os últimos pensamentos deles?” lhe perguntei sussurrando.

“Sim, um minuto, por favor...” – mas menos de trinta segundos – “bem... infelizmente, quem está queimando naquela fogueira são dois deles e Javier.”

Maria ficou perplexa, estava perdendo tudo tão rapidamente quanto conquistou. E, impaciente, se levantou e foi em direção a Ramón que estava muito perto da fogueira. Se fosse rápida o suficiente, chegaria e empurraria Ramón na fogueira – apesar que, o que poderia acontecer com um vampiro que cai em uma fogueira sem estar em pedaços? Talvez conseguisse uma linda cicatriz...

Muito adorável isso! Ajudaria muito com a nossa guerra!

“Ok” disse me levantando e correndo atrás de Maria. Olhei rapidamente para trás e vi que todos já me seguiam. Isto tinha de acabar rápido antes que o nosso grupo tivesse mais quedas...

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