Solitário - Capítulo 40: Deveria Mesmo?

Maria mal chegou lá e já arranjou confusão. Ela foi atacando tudo e a todos descontroladamente. Se ninguém a parasse, ela seria a próxima a ir para a fogueira.

Corri e a puxei para longe.

“Maria, você não pode agir assim...” – mas ela não estava me escutando, então, controle de emoções nela – “Me escuta, Maria! Você. Não. Pode. Agir. Assim. Entendido?”

Ela concordou com a cabeça, então se acalmou. Enquanto olhávamos para toda a algazarra de vampiros lutando – incluindo Gerardo lutando com três ao mesmo tempo –, Maria e eu fomos encurralar Ramón e sua mulher, pois ambos estavam fugindo pelo canto.

Fomos à direção o mais rápido que podíamos, mas então, no meio do caminho, outro vampiro apareceu do nada nos olhando intensamente. No instante não entendi, mas então percebi que tudo estava ficando branco aos poucos. E minha mente doía. Parecia que ia explodir. Parecia que tudo iria explodir em mim...

Mas tudo cessou antes que acontecesse. Tudo voltou ao tamanho normal em minha cabeça – meu cérebro parecia ter o dobro de tamanho do que normalmente antes. O que era branco começou a tomar cores aos poucos novamente.

Percebi que eu estava de joelhos no chão, e Maria estava deitada com as costas no chão.

“Está tudo bem com você?” lhe perguntei.

“Sim, mas por que perguntou?” ela me questionou sem sentimentos.

“Por que você está sem emoção alguma...”

“Não estou não... ainda sinto dor, e estou cansada... e com muita raiva também...”

“Mas eu não sinto...” comecei a me preocupar.

“Eu sei, também não vejo seu dom em você!”

“E vê ele por aí?”

“Não, não vejo nada por aí...”

“E viu o quê antes de não ter nada?”

“Vi que o menino conseguia causar dor e, dependendo da quantia dessa dor, podia nos deixar cegos, mas não deu tempo de lhe avisar... E o que você viu?”

“Vi que ele estava confuso e chateado por ter que dar cobertura aos dois fujões...”

“Ok, então ele está trabalhando contra a vontade dele. Talvez seja novo demais para ficar sozinho...”

“Ele estava com medo, mas não muito. Talvez não seja de ficar sozinho, mas sim de sofrer nas mãos deles.”

“Quem sabe a gente consiga trazê-lo para o nosso lado...”

“Você vai tentar?”

“Sim, quem sabe...”

“E posso saber quando vai fazer isso?”

“Quando encontrá-lo da próxima vez.”

“Eu quero dizer, antes ou depois dele te deixar cega de dor...”

“De preferência antes... mas se não der, depois mesmo...”

“Você faz as coisas parecerem mais fáceis do que realmente são... Você sabe disso, não?!”

“Fiquei sabendo agora!”

E então continuamos onde estávamos por mais alguns minutos. Tempo o suficiente para que pudéssemos nos recompor.

Dois minutos depois, nos levantamos e fomos correndo de volta ao local onde a luta estava rancorosa. Bem... agora não mais...

Francisco, Gerardo, Jorge continuavam ali perto da fogueira jogando alguns restos dos inimigos lá. Mas eu ainda estava estranho, e não pude ver por completo o que eles estavam sentindo.

Eu só sabia que o clima estava tenso.

“Onde estão os outros?” Maria perguntou.

Eles se entreolharam, e então eu soube, pelas expressões, que a notícia por vir não era a melhor de todas.

“Eles se foram!” Gerardo disse sem mais a completar.

Ok, isso significava uma péssima muito péssima notícia para nós. Mas muito, muito, muito péssima notícia.

“Quantos?” Maria quis saber.

“Miguel e Pedro” Francisco respondeu se sentando em um canto da sombria calçada.

“E dos outros?”

“Oito... Oito e meio... alguém conseguiu fugir levando metade, creio eu...” Gerardo disse em tom de zombação.

“Como assim?”

“Contei todas as partes e temos oito inimigos que foram, mas os últimos que foram para o fogo estavam só na metade aqui...”

“Mas o que diabos vão fazer com metade?” Jorge perguntou incrédulo com a falta de vergonha deles. Para falar a verdade, creio que todos não estavam acreditando no que tinham escutado...

“Vai ver ele tinha algum parceiro ou parceira, e então ele pegou para levar consigo” Gerardo respondeu.

“Ah sim, e então depois eles vão procurar uma bruxa que consiga fazer que os membros soltos do corpo criem a massa do corpo e se juntem novamente!” Jorge disse irônico, e não foi preciso ser o mestre das emoções para saber que ele estava sendo irônico.

“Por que não?”

“Porque bruxas não existem.”

“Por que não?”

“Porque não, cara!”

“Mas se vampiros existem, por que não bruxas e outros seres estranhos?” Gerardo fechou a conversa deixando todos pensativos. E o pior de tudo é que ele pensava do mesmo jeito que eu já cheguei a pensar antes...

“Ok, meninos, sem mais discussões. Temos de ir embora daqui o quanto antes!” Maria concluiu.

“Vocês estão bem?” Francisco nos indagou. “Sabe, é que vi pelos seus pensamentos que passaram por algo estranho!”

“Sim, eu já estou conseguindo ver os dons novamente. E você, Jasper?”

“Está voltando, mas aos poucos, bem aos poucos...” – e eu não estava gostando disso. Eu estava, como se diz, me sentindo pelado sem meu domínio de sentimentos. E isso era horrível...

“Bem, tudo voltará ao normal, não se preocupe. Mas vamos embora agora. Por hoje, já chega de sofrimento!” Maria finalizou.

E então voltamos para Monterrey com dois a menos em nosso pequeno exército.

...

“Porcaria!” Maria falava mal enquanto andava de lado a lado em nossa sala. “Porcaria, porcaria!”

“Sim, múltiplas porcarias!” Francisco disse brincando – sim, meu controle estava retomado. Ufa!!!

“Acalme-se, Maria. Se agirmos com cautela, tudo ficará bem!” tentei a acalmar.

“Mas e se não der?”

“Dará. Confie em mim.”

“Ok” e então se permitiu ficar mais calma – e tudo sem minha interferência. Estou ficando bom nisso...

“Mas isso significa que temos de cobrir melhor as outras cidades o quanto antes!” Gerardo começou.

“Sim, você tem razão! Então começaremos com a região, tudo aqui perto. Francisco, vá com Jorge e mais alguém a sua escolha procurar Marco em Torreón, e o avise de tudo!” Maria ordenou.

“Err... Gerardo, não poderia ir você em lugar de Francisco?” – todos se assustaram com meu pedido.

“Sim, claro” ele disse já se levantando.

“Posso saber por que, Jasper? Está tudo bem?” Maria se preocupou.

“Sim, está tudo bem. Só tenho alguns... alguns assuntos que eu gostaria de terminar com Francisco.” Fiquei olhando para ele para saber se ele estaria confuso, talvez até com medo do que eu tinha a resolver com ele, mas não houve nada. Nada mudou. Ele apenas estava lá tranquilo. Ele sabia do que eu estava me referindo!

“Ok, então. Gerardo, você pode?” Maria o pediu.

“Claro, vamos?” Gerardo chamou Jorge. Eles se levantaram, convidaram alguém e saíram a toda velocidade, nem se preocupando se outros poderiam vê-los por aí.

“Sabe, às vezes me pergunto onde errei com o negócio de ensinar esses vampiros se manterem invisíveis a olhos humanos...” disse fingindo estar pensando.

“Você nunca errou, eles é que são desobedientes demais...” Maria me respondeu.

“Talvez, nem isso... Talvez eles só se empolguem demais com esses tipos de assuntos...” Francisco completou.

“Deve ser isso!” ri em resposta.

“Bem, voltando, boa parte das minhas cidades já devem ter caído nesta hora, e estamos em desvantagem ainda, mesmo com dois a menos e eles com oito a menos...” Maria estava discursando, mas foi interrompida para uma informação complementar.

“Oito e meio! Eu estava lá e vi Gerardo contando” Francisco disse.

“Ok, oito e meio menos para eles. Isso quer dizer que Monterrey será defendida a todos os custos. Não cortarei esforços para defendê-la!” Maria disse, e a raiva estava retornando nela...

“Ok, ótimo, e tenho certeza que ninguém também se renderá, mas enquanto isso, temos de encontrar novos amiguinhos para nosso grupo!”

“Claro, pois vou eu então encontrá-los agora mesmo!”

“Não demore! E tome cuidado aonde vai, tudo bem?!”

“Tudo bem, Sr. Preocupação!”

“Gosto mais de Sr. das Emoções... quem sabe, Sr. Controle dos Sentimentos... e talvez Sr...”

“Ok, já chega, Jasper. Creio que todos já entendemos!” ela saiu rindo do quarto animada com a ideia de novos no grupo.

Fui em direção a Francisco, e então, quando decidi que iria falar com ele, foi ele quem falou primeiro.

“Ok, onde quer fazer isso? Onde se sente mais confortável para saber de seu passado?”

“Como você sabe?”

“Eu sei quais são os seus pensamentos, lembra? Os seus últimos, pelo menos!” ele disse confiante e orgulhoso de si mesmo.

“Qualquer dia você vai tropeçar em seu orgulho sabia?”

“Há! Vampiros não tropeçam, a não ser que queiram...”

“Bom garoto, aprendeu rápido!”

“Mas, então... onde?”

“Pode ser no topo daquela montanha ali?” lhe propus apontando com o dedo para o imenso monte de terra ali perto pela janela.

“Claro. Agora?”

“Sim.”

“Então vamos!”

Saímos correndo e chegamos mais rápido que o de costume na montanha. Sentamos e ficamos apenas admirando a paisagem.

“Então” ele disse para quebrar o gelo entre nós, “por onde quer começar?”

“Você consegue controlar?”

“Sim.”

“E por que não me contou antes?”

“Surpresa?” ele disse sem graça.

“Eu odeio surpresas, às vezes...”

“Eu sei, eu também!”

“Mas as pessoas que geralmente odeiam não fazem surpresas para os outros!”

“Eu também sei disso.”

“Então?” tentei desconversar.

“Então, desculpa!” – mas ele não entendeu.

“Não, eu não tava falando disso! Estava me referindo a nossa conversinha anterior sobre a parte de controle.”

“Ah sim, por onde quer começar?”

“Não sei.”

“Quer fazer um apanhado geral de tudo?”

Não soube o que responder. Na verdade, tinha medo de responder. Eu não sei se eu realmente queria saber das coisas, mas também tinha anseio de não saber depois, caso algo acontecesse a mim ou a ele.

“Quero” lhe respondi com minha voz trêmula, incerta. E então as imagens voltaram.

Eu estava me olhando no espelho turvo de um quarto claro. Depois eu estava brincando com o menino, e o chamava de Bryan. Depois eu soube que o tal Bryan era meu irmão. E, por infortúnio, soube que ele morrera de pneumonia enquanto eu ainda era pequeno. Depois soube que quase me casei duas vezes, mas só gostei da segunda senhorita. Depois eu estava muito triste sentado em um canto da cama após chutar os bonequinhos de guerra. Depois eu escrevia uma carta e deixava na sala da casa bonita com várias velas para iluminar. Depois eu estava caminhando por uma estrada com péssimas roupas. Depois eu ganhava roupas e alimento. Depois eu estava me exercitando com vestes – fardas, pensei comigo – em um grande balcão. Depois eu estava com várias pessoas da alta patente em uma reunião. Depois eu apertava as mãos de um soldado mexicano. Depois eu pegava um cavalo e ia com uma menina para algum lugar. Depois eu encontrava Maria.

“Ok, creio que dessa parte para frente já me lembro das coisas...”

“Ok, você é quem sabe...”

“Sim, eu sei... pelo menos parte das coisas, eu sei... Mas, você também sabe, não?!”

“Sei, mas não se preocupe, não sairei contando para todos o que você fez ou deixou de fazer antes de se transformar um vampiro. Se eu fosse assim, não haveria ninguém perto de mim.”

“Você vê as coisas sempre assim? Quer dizer, as pessoas sabem que você está lá vendo?”

“Na maioria das vezes não, pois só vejo as coisas mais superficiais em uma pessoa. Só sei das profundezas de sua alma quando ela libera o caminho para mim!”

“Ótimo, então você não tem a liberdade então de sair contando para as pessoas essas coisas...”

“Ok, eu não contarei a ninguém!”

Ótimo, é bom mesmo ele não contar a ninguém. Não sei se alguém gostaria de saber que eu tive um irmão que morreu, e eu, o menorzinho da família, ficou para trás despedaçado em depressão. E também não quero que os outros fiquem me perguntando sobre essas coisas.

Agora, pensando bem, não sei se fiz bem em saber dessas coisas. Eu não deveria ter feito isso. Não deveria!

“Deveria sim, Jasper.”

“O quê? Ah sim, às vezes me esqueço.”

“É melhor se afogar no profundo oceano de nossa mente quando se está claro em vez de quando estiver escuro.”

“Obrigado por sua sabedoria mestre!”

“De nada” ele respondeu brincando, e então voltamos para casa. Tínhamos de ajudar Maria com alguns corpos para os recém chegados.

1 comentários:

Vivisrolling disse...

ah cara
eu num gosto do jasper com a maria não... entre ela e a duffy, prefiro a duffy... mas entre as duas e a alice, eu prefiro a alice!!
=D

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