Solitário - Capítulo 60: Saltitante

Fui para a Filadélfia. Não havia muito que se fazer por lá, mesmo que a paisagem fosse extremamente bonita. Os campos aqui pareciam ser bem mais saudáveis do que em qualquer outro lugar que já tinha visitado.

Garoava e uma tempestade estava por vir.

Eu já tinha perdido a vontade de visitar a casa do tal escritor, então resolvi caminhar, conhecer os cantos da cidade.

Não demorou muito e a tempestade castigou os que andavam desprevenidos na rua, assim como eu. E isso me deixava à vontade.

Mesmo sendo dia, e a luz quase inexistente por conta da chuva intensa, eu estava com uma sensação estranha. Eu me sentia como se algo fosse ocorrer, mas eu estava cansado de lutar. Se meu destino fosse morrer, eu me entregaria e não iria contra.

Ficar na chuva estava começando a me deixar desconfortável demais. Os pingos de chuva batiam forte em minha pele resistente, e isso incomodava. Além de que, a maioria das pessoas já tinha entrado em suas casas ou procurado algum abrigo.

Eu estava chamando a atenção no meio da rua em meio a uma tempestade.

Olhei para os lados, mas não havia nada demais por lá. No entanto, fiquei curioso por um local que tinha um grande letreiro com o nome do local em letras cursivas antigas – mais especificamente, as que eu aprendia quando pequeno.

Era um restaurante. Mesmo que eu não comesse nada por lá, eu precisava de um abrigo. Precisaria me controlar também, mas eu daria um jeito nisso. Resolvi entrar lá.

O ambiente era pequeno, escuro e vazio. As janelas e o chão não eram limpos há um bom tempo, e eu acredito firmemente que isso podia ser um dos motivos pela falta de clientes...

Para minha sorte, a pouca luz que entrava não interferia na minha cintilante pele. Ela também acabava que por favorecer a cor escura – o vinho escuro – de meus olhos. Em “dia normais”, os tons avermelhados seriam chamativos demais.

Os tons de vermelhos eram contrastantes com a tonalidade de minha pele, e com isso, pode se ter certeza de que éramos a atração da cidade. Quanto mais vívido, mais estranhos seríamos.

Mas, graças ao meu pouco senso de humanidade, minhas pupilas estavam escuras. Para um humano, eu teria certeza que meus olhos seriam castanhos escuro.

Despreocupado com o que poderia me acontecer justamente neste fim do mundo, uma pequena senhorita pulou de um banco de lá do canto assim que me viu. Confesso, fiquei chocado com a sua atitude.

Quem pularia tão feliz assim quando vê um desconhecido?

Eu não tinha a resposta, então tentei lembrar sua fisionomia. Ela poderia ser alguma pessoa que eu já tinha encontrado uma vez, e eu é que não me lembrava dela... Eu já tinha esquecido tanta coisa e me lembrado de tantas outras, ela poderia ter sido uma dos infelizes da qual não me recordei...

Ela, no entanto, tinha certeza da direção. Ela viria até mim. Ela estava vindo até mim...

Aquilo me preocupou. Quem era ela? Será que eu tinha atacado algum companheiro dela e agora ela estava querendo vingança?

Mas... Poxa, justo agora?! Aqui?!

Se nós dois começássemos a brigar, tenho a certeza absoluta de que seria uma carnificina. Dois vampiros não conseguem se conter em uma luta quando o amor está em jogo. Vampiros podem ser extremamente cruéis, se quiserem... E eu sabia como ser, infelizmente!

Ela continuava em minha direção, e em cada passo que ela dava, parecia que estávamos em câmera lenta – aquele efeito que as pessoas fazem nas telas do cinema, sabe?!

Comecei a analisá-la. Ela não tinha feições bravias ou o físico de alguém que lutaria em uma batalha. Ela era delicada demais para uma brutalidade como essas... E em sua expressão não havia algo sério ou de alguém bravo. Ela estava... sorrindo!

Mas... como?! Ela sequer me conhece! E eu nem a conheço!

Como alguém pode agir assim, tão confiante? Ela estava otimista com tudo aquilo, ela sabia de coisas que eu, provavelmente, não sabia...

Será que ela sabia que eu era o Major? Será que ela era de Houston e finalmente veio me desmascarar?

Mas que inferno isso! Eu não tinha respostas para minhas próprias perguntas!

Entretanto, ela era linda! Majestosa! O seu sorriso brilhava na escuridão do restaurante como se fosse a Lua.

Deus, ela era realmente linda e cativante! Aquilo também me chocou, pois eu passei muito tempo até ver o sorriso no rosto de uma vampira totalmente desconhecida por mim.

Obriguei-me a sair do dos pensamentos, e ela então parou à minha frente. Ela era mais baixa do que eu, e aparentava ser uma bonequinha de porcelana.

“Você me deixou esperando por tempo demais” ela disse toda otimista. A sua sinceridade me deixou pasmo! Ela falou de um jeito como se nos conhecêssemos há anos...

A beleza dela era literalmente atordoante. Demorei um curto segundo para obrigar meu cérebro a formular uma frase sem gaguejar, mas creio que o que eu disse foi meio que automático. Foi sem pensar...

Eu estava cego por ela, não existia mais ninguém naquele local para mim...

“Desculpe, senhora!” tentei ser gentil com ela – eu queria agradá-la, cortejá-la.

Ela estendeu a mão, que a peguei sem pestanejar e lhe dei um beijinho na palma. Pela primeira vez em minha vida pós-morte, desde a minha transformação para vampiro, eu sinto o que é a esperança. O que eu sentia antes, ou pensava sentir, não passava de meros sussurros.

O seu aroma, a textura de sua pele... Deus!Eu estava completamente apaixonado por uma desconhecida.

“Desculpe-me a falta de educação, mas sou Jasper...”

“Whitlock, sim, eu sei!” – ela estava realmente feliz. “Sei de muitas coisas e tenho de falar tudo a você, mas sei que iremos ter um tempo para nós antes!” – ok, a bonequinha me deixou completamente confuso.

“Eu não... não entendo!”

“Você é vampiro há quanto tempo? Parece que te procuro há taaanto tempo. Você realmente demorou!”

“Ah... Desculpe-me, senhorita.”

“Ah, está tudo bem. Quer sentar para conversar?” – ela estava me convidando para sentar e conversar com ela, e para minha sorte, eu era um vampiro que tinha pelo menos o mínimo de auto controle. Se eu fosse humano, tenho certeza que não conseguiria mover nem um músculo.

“Sim, claro!”

Fomos para uma mesa, e então puxei a cadeira para que ela se sentasse. Ela agradeceu, se virou delicadamente e se sentou, os cotovelos apoiados na mesa.

“Então...” tentei encontrar algum assunto em minha mente para conversar com ela, mas ela estava tão feliz que aquilo estava me deixando em êxtase. Eu estava ficando tão feliz quanto ela... Organizei meus pensamentos e então decidi que iria perguntar a ela o seu nome e sobre o que ela tinha me dito antes, sobre estar me esperando, os assuntos ainda a serem contados e o tempo que passaríamos juntos.

“Sobre o que você quer falar primeiro?”

Ok, ela era linda, magnífica, mas estava me deixando confuso...

“Mas, ah, desculpe-me, mas como faz isso?”

“Eu tenho um dom, e sei que você também tem um!”

“Bem, sim, eu consigo controlar as emoções, os sentimentos...”

“Sim, e isso é tão legal quanto o meu.”

“Obrigado, mas eu poderia saber qual é o seu? Estou curioso!”

“Eu consigo ver o futuro a partir das decisões tomadas!”

“Ah...” – eu ainda estava confuso.

“Quando as pessoas tomam decisões, eu consigo ver o futuro delas. Mas isso só acontece quando elas realmente decidem. Quando elas estão em dúvida ainda, tenho apenas reflexos...”

“Uau!”

“Sim...” ela disse envergonhada, o que a deixava mais graciosa ainda...

“E sobre as outras coisas? O que você sabe?”

“Você quer dizer, como eu sabia de você?” ela propôs.

“Bem, eu acho que sim...” lhe respondi incerto.

“Eu tive uma visão de você anos atrás procurando por um lugar realmente seu. E aconteceu que você só foi se distanciando deste local, mas mesmo assim, você decidia ir lá algum dia, seja lá onde esse local fosse.”

“E você soube de mim assim? Procurando pela minha casa em Houston?”

“Sim, você procurava sempre algo, mas nunca ficava perto. As coisas nunca foram boas para você, mas, no fundo, você acreditava que as coisas poderiam melhorar... Antes de você decidir encontrar sua casa, voltar a Houston, como você disse, você estava muito triste, e isso me magoava muito...”

Deus, eu estava magoando esta pobre e pequenina deusa. Eu era realmente um monstro acima de todos os outros existentes no mundo! Eu era o rei monstro, e eu me puniria de alguma forma por causar-lhe dor.

Ela parou de falar e ficou olhando para o nada com os olhos abertos enquanto eu pensava. Fiquei preocupado, eu não queria machucá-la mais ainda...

“Nem pense nisso, Sr. Jasper Whitlock. Não vê que a dor mais excruciante é saber que não tenho você por perto?”

Ok, se antes eu já me sentia completamente apaixonado por ela, agora eu sabia que meu mundo também girava em torno dela.

“Desculpe-me!”

“Você pede desculpas demais, sabia?!” ela disse em tom de ofensa.

“Desculpe-me.”

“Como?”

“Ah... err... então...”

“O que mais quer saber antes de partirmos em viagem?”

Comecei a pensar, e então quando fui falar, ela roubou a cena.

“Sim, sim... Me esqueci! Sou Alice!”

Alice... Até o nome era angelical, perfeito!

“O que mais, Jasper?”

“Você é vampira há muito tempo? Por quanto tempo realmente me esperou? Te fiz esperar muito?”

“Você já sofreu muito, Jasper, e eu sinto muito por isso, mas eu sei que as coisas melhorarão pela frente. Seremos muito felizes juntos, então pare de se preocupar, ok?!”

“Ok, obrigado pelas palavras confortadoras...”

“Eu sabia que você gostaria delas” ela disse e me deu um sorrisinho esperto. “Sou uma vampira há algum tempo já, há uma ou duas décadas, e venho viajando desde então. Mas, ao contrário de você, não me lembro de minha família, amigos, ou até mesmo quem me transformou!”

“Sei, às vezes a memória se apaga facilmente mesmo. É assim que funciona a mente humana.”

“É, mas gosto mais da vida dos vampiros!” ela estava empolgada novamente. “Podemos fazer coisas magníficas...”

“Corremos muitos riscos também...”

“Mas vale a pena! Ou vai dizer que não?!”

Preferi não responder, até agora, minha situação não tinha me favorecido muito.

“Ok, então esquece tudo. Tenho coisas a lhe contar!”

“Sobre o quê?”

“Sobre nós e o nosso futuro!”

“Hmmm... E o que será de nós, Alice?” – minha fadinha de porcelana. Eu a chamaria assim mais para frente, daqui algum tempo...

“Gostaria de ser chamada assim desde já! Pode ser?”

“Ah, sim...” – eu estava me esquecendo de seu dom. Ela era linda demais, e aquilo estava realmente tirando o chão de meus pés. Eu não estava mais funcionando muito racionalmente... Espero que ela compreenda se eu disse algo errado... “Alice, minha fadinha, o que você tem a falar sobre nós?”

“Adorei ser chamada assim, Jazz... Posso te chamar assim, não é?!” – confirmei com a cabeça. Eu realmente tinha gostado da nossa relação, afinal, ela me amava e eu a amava, mesmo que nós apenas nos conhecíamos há alguns minutos...

Acabei rindo com tamanha alegria que ela estava sentindo. Eu jamais teria coragem para manipulá-la. Eu seria a pessoa mais sincera, honesta e dedicada com ela. Enfim, seria a melhor pessoa para ela.

“Então, eu sei que iremos ficar juntos e também sei que há alternativas para nossa vida de vampiros!” – como? O que ela disse? Vida alternativa? Há! Sei! “Há uma família de vampiros liderados por um rapaz de feições jovens e cabelos claros, mais claros que os seus, e ele se chama Carlisle Cullen. Sua família é diferente de todas as outras...”

“E... bem, você espera que façamos o quê com ele?”

“Nos juntaremos a eles!”

“E isso dará certo?”

“Olhe, eu sei que há muito dúvida ainda a respeito disso, mas eu sei que dará, mais cedo ou mais tarde!”

“Bem, se você diz, eu confio plenamente!”

“Adoro quando você fala assim!”

“Posso falar assim o quanto você quiser minha fadinha!”

“Ai ai...” ela suspirou.

Fomos nos aproximando inconscientemente, e então quando estávamos quase nos beijando, um relâmpago cortou o céu. Isso a assustou, e então ela ficou envergonhada.

Eu não deixaria que ela se reprimisse comigo, não seus sentimentos. Eu prometi a mim mesmo ser a melhor pessoa para ela, e eu senti que, nesta hora, o que ela precisava era de proteção.

Passei meus braços por seus ombros, e a acomodei em meu corpo. Pude sentir sua pele macia no braço e o cheiro floral do shampoo de seu fino e delicado cabelo.

Ela era tão delicada, no geral...

Ficamos ali naquela mesma posição por alguns minutos. Nem eu, nem ela, queríamos que aquele momento acabasse. Por fim, ela decidiu que estava na hora de continuarmos a conversa.

“A tempestade já está para passar, então preciso lhe falar uma última coisa!”

“Pode dizer o que quiser, minha bonequinha!” – ela fez careta. “Fadinha?” – ela ficou imensamente feliz.

“Eu sei que você vai estranhar, mas vai se adaptar ao estilo de vida com o tempo. Será difícil, mas conseguiremos juntos!”

“Bem, você está me deixando muito curioso!”

“Os Cullens são diferentes porque vivem de uma forma diferente!”

“Hmmm... Isso quer dizer...?”

“Isso quer dizer que eles vivem como se fossem humanos, eles conseguem interagir e tudo o mais, e não os atacam.”

“Isso é... isso é bom, muito bom, para falar a verdade!” – eu estava realmente feliz por tê-la encontrado! Alice, minha fadinha contente! Eu estava adorando repetir seu nome, mesmo que mentalmente. “Acredita que funcionará com... com... enfim...”

“Com nós dois dará certo, só levará um certo tempo.”

“E como eles sobrevivem?”

“Animais!”

“Animais?!” – sabe que eu nunca tinha pensado neles?!

“Sim, veados, ursos, leões... Cada um deles tem uma preferência em especial, outros não.”

“E, bem, eles conseguem ficar... bem?!”

“Sim, até demais!”

“Bom, então, se você diz que será bom para nós ficarmos lá com eles... Eu concordo!”

“Ah, obrigada, Jazz... Obrigada por ser tão carinhoso comigo assim, também... Isso é tão novo para mim!”

“É tão novo para você quanto é para mim! O que eu pensei ter sentido antes, na verdade, não foi nada em comparação com o que sinto agora! Eu... eu... eu te amo!”

“Sim, eu também te amo!”

Ela fechou os olhos, e então nos aproximamos novamente. Desta vez, nenhum relâmpago interromperia o nosso momento!

Toquei seus doces lábios, e senti que estava no céu. Alice, minha fadinha, também era agora o meu paraíso!

...

Ficamos ali sentados até a tempestade passar. Eu não queria que ela corresse riscos, mesmo que seja de apenas chamar a atenção. Agora ela era o amor de minha vida, e era minha responsabilidade cuidar de seu bem estar.

Começando desde já, olhei para ela, ainda meio que absorto no que acontecia lá fora, e então dei o veredicto final.

“Está na hora de irmos!” disse já me levantando.

“Sim” ela pegou em minha mão e levantou, “temos de ir e você tem muito a me ensinar ainda!”

“Sim, e lhe ensinarei tudo que sei! Absolutamente tudo!”

Ela sorriu, e aquilo pagou por tudo o que houve ou deixou de acontecer em minha vida.

Caminhando tranquilamente para a saída do restaurante, senti que, finalmente, minha existência tinha um sentido! Eu estava com a minha fadinha, que estava toda saltitante!

Saímos do restaurante e fomos para um hotel que Alice diz viver. No caminho, ela disse que teríamos de comprar roupas novas, não só para mim, mas para ela também. Além, lógico, de sapatos, malas, bolsas, um carro...

Agora eu me encontrava otimista por saber que eu tinha toda a eternidade para passar ao lado de Alice, minha fadinha saltitante!

Eu estava com o meu amor, a essência de minha vida, e nada mais a tiraria de mim! Se algum dia isso acontecesse, eu não sei quanto segundos mais eu conseguiria suportar! Ela era a minha vida, agora e para sempre!

FIM.

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